07 de julho de 2018, Bruno Lima Rocha
O empresariado está alçado na Linha Chilena
Escrevendo ao calor da hora e cumprindo modesta função militante no apoio de análise pedido, observo que há uma evidente inclinação do empresariado de São Paulo, os controladores restantes do PIB “nacional” para a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL-RJ). Em evento recente na Confederação Nacional da Indústria (CNI), o parlamentar de sete mandatos assumiu “não entender nem de economia ou de educação” e disse que contaria com assessoria e corpo auxiliar adequado. Aí já mora um enorme perigo.
Primeiro porque as ciências econômicas não se resumem a “tipo ideal de microeconomia” e menos ainda a uma “distopia tipo Consenso de Washington”. Ou seja, se ele Presidente não sabe que rumo indicar, ou omite, ou será governado pelos seus “assessores”. Daí não há dúvida alguma que estamos diante do perigo de uma “linha chilena” modelo “alt-right” adaptado ao Brasil do século XXI. Essa suspeita se complementa com o fato de, ao “entender quase nada de educação”, mas haver faturado muito no proselitismo criacionista e heteronormativo, Bolsonaro talvez aprofunde não “apenas” a presença de agentes econômicos na educação (como se já fosse pouca ameaça), mas também princípios dogmáticos que vão ao encontro do ideário neopentecostal e pentecostal devoto da Teologia da Prosperidade.
É enganoso pensar que o Poder Executivo pouco pode fazer, haja vista o potencial de estragos e retrocessos em dois anos com Michel Temer (MDB/SP e repito, vice-presidente eleito e reeleito com Dilma Rousseff) obtidos a partir da captura do Planalto pelo bloco de poder perdedor nas urnas.”
Duas balas de prata na Campanha: os votos de Lula e a Globo
A Bala de Prata da campanha eleitoral de 2018 é saber se caso o ex-presidente Lula de fato não consiga concorrer à Presidência, se ele terá condições de transferência de ao menos metade das intenções de voto? Se sim, em que condições o preposto ou a indicada chegará ao segundo turno caso tenha de concorrer com os votos do trabalhismo, da centro-esquerda e do reformismo à esquerda? Minha aposta, e é aposta mesmo: se Lula transferir metade de suas intenções de voto e o campo que vai da candidatura de Ciro Gomes (PDT) até à de Guilherme Boulos (PSOL) não entrar em luta fratricida, a eleição está definida a não ser que tenhamos uma fraude grosseira.
A segunda Bala de Prata é saber se e caso Bolsonaro dispare como único candidato neoliberal com chances de vitória, se a emissora líder, a Globo, adere à campanha, ou ao menos não vai bombardeá-lo com matérias “investigativas”. Não é exagero afirmar que a Globo faz excelente jornalismo, mas, quando quer ou ao menos quando as altas esferas do Jardim Botânico e do Cosme Velho assim o permitem. Ouso arriscar que uma adesão envergonhada dos Marinho à aventura de Bolsonaro e os piratas do mercado especulativo pode causar uma rebelião no Projac e adjacências, como no elenco do GNT por exemplo. A Globo sempre soube ser tolerante e “liberal nos costumes” com seus funcionários e a Lei Chico Pinheiro já denunciada pela FENAJ até o momento só atinge ao “jornalismo”. Ou seja, só pega o info-entretenimento no formato noticioso, ou a propaganda pró-mercado na forma de telejornal e mídias em multiplataforma. Se houver uma rebelião dos estúdios, como já se ensaia, tudo pode acontecer no segundo semestre de 2018 com a candidatura de Bolsonaro.
Só resta entrar em todas como dividida e canelada
Agora que a seleção brasileira terminou eliminada pela Bélgica nas quartas de finais, é possível que os tempos da política comecem a correr mais rápidos. A impressão que me dá é a do consenso restante. Ao menos naqueles que apoiaram o golpe jurídico-parlamentar e este é o desmonte de todas as possibilidades de um desenvolvimento periférico dentro de uma semi-autonomia, ou mesmo com pretensões à alguma autonomia do Brasil no Sistema Internacional. Alguém pode se perguntar: isso tem relação direta com uma política mais à esquerda? Não, e sim, nesta ordem. Não, porque estou afirmando que o golpe de 2016 não foi contra um governo de esquerda e sim contra o capitalismo brasileiro e suas possibilidades mais que concretas de reposicionar o país na hierarquia entre os Estados e no Grande Jogo Mundial.
Sim, porque em não havendo chances concretas de medidas paliativas, luta-se cada vez mais para manter o mínimo, ou ao menos, conquistar algo. A base para um desenvolvimento com soberania popular é, além da própria soberania do povo em movimento, a capacidade já instalada no território. Parece uma obviedade, mas não há coletivização se restar pouco ou nada para ser coletivizado. Ou, como imaginamos obter os frutos coletivos do Pré-Sal se sua exploração estiver toda ela contratualizada com empresas vinculadas ao aparato de Defesa dos EUA e da OTAN?! Não fica impossível, mas fica mais difícil, aumentando ainda mais a margem de negociação na inexorável caminhada da social-democracia no eterno rumo do “centro da política”. Para quem joga na ponta esquerda da política – tal e como este mortal que aqui escreve – é a conta mais salgada, tendo de gastar mais energia contra o inimigo interno e uma tensão cada vez maior com os adversários do mesmo campo circunstancial.
Há sim uma marcha para a direita e uma ação lesiva do empresariado “nacional”. Vamos entender a afirmação. Eu não creio na saída com a hipotética aliança com alguma “burguesia nacional progressista”. Mas, não é porque não creio que não reconheço esta via, ou seja, isto existe, se as forças de centro-esquerda puserem um cabresto na CNI, FIESP e cia. Tal e como o governo Geisel fez em 1974 e 1979 e justo por isso os empresários do país romperam com o governo cujo projeto estratégico os elevava à condição de força auxiliar no tripé da Potência Tropical. Por serem auxiliares da tecnocracia fardada, não toparam mais. Ou seja, tinha cabresto de sobra – e adequado – vigiando os agentes econômicos. E nisso, estava correto o Poder Executivo, tirânico ou democrático, há que conter e controlar as “forças de mercado”. Agora, não tem mais cabresto, e nem pacto.
E justo para não terem mais cabresto algum, os capitães de indústria restantes – as casas importadoras, quase maquiladoras de luxo daqui a pouco – estão topando até a aventura proto-fascista na intenção de manterem suas margens de lucro e as vantagens no acesso aos recursos do Estado. E o fazem, mesmo sabendo que o apoio ao tucanato ou a Bolsonaro ou a alguém mais dessas vertentes, pode implicar no fim do BNDES, da PETROBRÁS e da ELETROBRÁS, sendo que nesta semana foi para a Boeing a EMBRAER. Trata-se de liquidacionismo sim, puro e direto. Como disse o professor de economia da UFRJ Carlos Pinkusfeld (VER) é a aplicação do Consenso de Washington no Brasil do Século XXI. Seguindo o padrão brasileiro, esta aplicação se dá por atores (individuais) e agentes (coletivos) dramaticamente nacionais, ainda que ENTREGUISTAS ou OLIGARCAS setoriais.
Para concluir trago uma conta de chegada: quem ganhar em outubro, se vier do Trabalhismo no rumo da Esquerda Reformista, precisará de muito mais força social do que imagina, ainda que seja para reverter as medidas de desmonte executadas pelo governo ilegítimo de Temer e Meirelles e firmar alguma correlação de forças para um novo pacto interno.
Percebam: ideologicamente não sou a favor de pactos, mas a idade já avança em demasia para não confundir ideologia com teoria. Teoricamente, no tabuleiro jogado no Brasil hoje, está mais difícil um pacto de classes como o lulismo. É isso. Mesmo quem quiser executar este pacto, vai penar muito mais do que com uma Carta ao Povo Brasileiro e a manutenção do Tripé Macroeconômico (a sandice neoliberal que o demente do Bolsonaro não entende ou desconhece) como ocorrera entre 2003-2006.
Está duro o jogo aqui dentro, duro mesmo. E agora, tudo é canelada na direita, joguemos pelas urnas ou não.
Bruno Lima Rocha é pós-doutorando em economia política na UFRGS, cientista político e professor de relações internacionais e jornalismo. (estrategiaeanaliseblog.com / blimarocha@gmail.com)