O Repórter Popular acompanhou os acontecimentos nessa última semana, em que
metalúrgicos paralisaram a produção e rejeitaram o plano da GM que ameaça os direitos dos trabalhadores. Entrevistamos três metalúrgicos que acompanharam de dentro esse processo. Preservaremos as fontes a pedido dos mesmos para evitar qualquer tipo de retaliação por parte da empresa e do sindicato.
RP – Nas notícias veiculadas na mídia, deram voz para a empresa e para o
sindicato, mas qual é o sentimento do peão que está dentro da fábrica?
De maneira geral, há uma desinformação muito grande. Achamos que isso é de propósito. Eles se preocuparam com a imagem deles lá fora. Porém, nem a GM e tampouco o sindicato fizeram qualquer explicação sobre o que realmente poderá acontecer conosco. Na medida em que as notícias iam aparecendo, fomos apertando os caras e aí a indignação tomou conta do pessoal. Com o negócio que querem nos empurrar é trabalhar pra adoecer ou morrer dentro da fábrica.
RP – E a justificativa da GM de que poderá sair da América do Sul? O pessoal
não teme ficar desempregado?
Essa é uma grande mentira. A saída da América do Sul é fora de cogitação porque a produção daqui abastece o mercado do próprio continente. Não compensaria pelos custos de produção irem para outro lugar. Em termos de mão de obra, aqui mesmo a GM tem um lucro extraordinário às custas da nossa exploração. Em média, pagam menos de dez reais por hora, o que dá um pouco mais de dois dólares no cálculo dos gringos.
RP – Como está a situação nas outras fábricas da GM no país?
A tática de chantagem da GM tem sido a mesma. A única diferença em cada lugar é a pauta e retirada de direitos. Isso porque algumas medidas que estão tentando impor agora em São José dos Campos e São Caetano, por exemplo, já tinham sido implementadas aqui em Gravataí. Ou seja, nós, trabalhadores da fábrica de Gravataí, somos um laboratório de exploração, onde a GM enriquece cada vez mais às nossas custas. Ganhamos 40% menos do que um trabalhador metalúrgico em São José dos Campos. O piso salarial da GM de Gravataí é inferior a R$ 1600, e a empresa quer reduzir pra R$ 1300. Em São José dos Campos esse piso é de R$ 2300.
RP – Como tem sido a atuação do Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí nessa
conjuntura?
O sindicato filiado à Força Sindical só finge que está defendendo os trabalhadores, quando na verdade atua como um facilitador a serviço dos patrões. São pelegos, aliás, sempre foram. A história do sindicato se confunde com a vinda da General Motors para Gravataí. Na época, isso no final dos anos 1990, um grupo desses pelegos atuou para fundar um sindicato de metalúrgicos na cidade. Com isso, dividiriam a base sindical que estava vinculada ao sindicato dos Metalúrgicos de Porto Alegre. Isso foi feito de forma fajuta e sem nenhuma legitimidade de discussão com os trabalhadores. O curioso é que a própria GM negociava com os pelegos, que sequer tinham carta sindical reconhecida pelo Ministério do Trabalho. No decorrer dos anos, empresa e “sindicato”, de mãos dadas, atuaram juntos até ser reconhecida formalmente a atuação dos pelegos. GM e sindicato construíram uma aliança para explorar os trabalhadores.
RP – Ok. Vocês se referem ao passado do sindicato. Mas nessa semana as
manchetes veiculadas na mídia diziam que a atuação do sindicato fez a GM
recuar nas propostas. Como vocês explicam isso?
Os pelegos que estão no sindicato fazem um jogo de cena. Publicamente, falam que a pauta foi rejeitada, mas no final da última assembleia deram um golpe e o encaminhamento virou pela manutenção do acordo anterior com a contrapartida de negociar as novas propostas. Isso é perigoso. Os operários estão revoltados com a situação. Não tem como engolir a proposta da GM. O problema é que vão deixar a poeira baixar para fazer o jogo dos patrões, que será adotar as medidas aos poucos e com sindicato fazendo vista grossa sem convocar assembleia. Para o trabalhador, a empresa vai empurrar contratos aditivos para ir implementando essas propostas. Aliás, foi assim que ao longo desses anos empurraram goela abaixo uma série de retrocessos. Outra coisa, esse acordo coletivo de 2017 havia sido estabelecido para três anos, ou seja, ainda está em vigor, mas atualmente é ameaçado pelas novas propostas da GM. Esse acordo já não era lá essas coisas e os caras querem piorar. Pra ter uma ideia, numa das assembleias em 2017 os metalúrgicos das empresas sistemistas rejeitaram essa proposta e vaiaram a direção do sindicato. Porém, após algumas manobras e desmobilização, os pelegos impuseram esse acordo que já não atendia as reivindicações do conjunto dos trabalhadores.
RP – Quais são as perspectivas daqui pra frente?
É necessário que os trabalhadores metalúrgicos assumam as rédeas da luta. Há muita luta para fazer e não podemos confiar na direção deste sindicato. A GM e o sindicato atuam contra os trabalhadores. A atual direção do sindicato assume o papel de dificultar a real participação dos operários nas decisões de interesse da categoria. Para as eleições sindicais, por exemplo, ultimamente fizeram alterações fajutas no estatuto para dificultar a participação. Até o mês de abril deste ano devem ocorrer as eleições e o prazo para publicação do edital é entre este mês de fevereiro até o início de março. Os metalúrgicos precisam estar atentos. O descontentamento e a rebeldia existem no chão da fábrica e o sentimento é de que as coisas precisam mudar. O que os metalúrgicos estão sofrendo na pele é quase um fato consumado da Reforma Trabalhista, que governos e patrões pretendem impor a toda a classe trabalhadora neste país. A indignação precisa se transformar em instrumento de organização. Nós, metalúrgicos da Oposição Metalúrgica de Gravataí, nos inscrevemos modestamente como alternativa.
*Entrevista concedida dia 01°/02/2019 pelos metalúrgicos da GM organizados na
Oposição Metalúrgica Gravataí. A íntegra das 21 propostas com a posição crítica estão
no endereço http://intersindicalgravatai.blogspot.com