“Meu pai”: Anthony Hokpins, Alzheimer e um belo filme

A boa obra de arte é aquela que consegue transmitir os sentimentos, as sensações, a experiência individual ou coletiva dos personagens ou da conjuntura histórica através de sua forma. Não basta indicar, por exemplo, que o filme é triste, é preciso fazer o telespectador sentir essa tristeza através das imagens, que compõem a forma do filme. Meu Pai, filme de Florian Zeller, de 2020, que rendeu o Oscar de melhor ator para o grande Anthony Hopkins, é um belo exemplo disso.

O longa, disponível no Netflix, conta a história de um homem idoso que sofre de Alzheimer. Ele vive com a filha em um apartamento em Londres devido à doença. A narrativa se desenrola entre as idas e vindas das contratações de cuidadoras, que Anthony se recusa a aceitar, e o desafio cada vez maior da filha Laura de cuidar de seu pai e não prejudicar a sua própria saúde.

Do ponto de vista estético, que é o que mais me interessa, acompanhamos cenas que se repetem, ora com um início diferente, ora com um final distinto, em que muitas vezes há troca dos atores que interpretam aqueles personagens. As reviravoltas das ações confundem o público que assiste ao filme: qual daquelas cenas é a verdadeira? Será que Anthony lembra direito do que aconteceu?

Desde o início do filme, com uma trilha sonora alta enquanto Laura caminha na rua de volta para casa, percebemos que todos os elementos fílmicos (imagem e som) se referem ao protagonista, Anthony. Essa música erudita que toca a todo volume não é uma trilha sonora propriamente dita, pois quem a está escutando com fones de ouvido é Anthony. Um recurso interessante para indicar o protagonista do longa. Isto é corroborado pelas cenas acima citadas, onde há repetição e alteração de pequenos detalhes que nos informam da confusão mental que Anthony sofre. Portanto, o diretor conseguiu nos fazer sentir confusos, graças a sua direção, que pôs na forma uma montagem de cenas com trocas de atores, impossibilitando o telespectador de identificar a sequência lógica e real da narrativa, tal como Anthony percebe sua vida a partir de seu quadro clínico.

Como corolário do belo filme, a atuação de Anthony Hopkins é excelente, nunca exagerado e sempre conseguindo aparentar o que o diretor quer transparecer. Uma das poucas ótimas opções no cardápio de filmes da Netflix.

Rodrigo Mendes