Antifascistas sim, clubistas também! Quais os limites éticos do clubismo no ambiente do futebol?
Dada a conjuntura desses tempos estranhos, a pergunta ganha relevância. Muito já se falou sobre o ambiente supostamente despolitizado do futebol. Adaptou-se Marx para dizer que o futebol é o ópio do povo; não raro, vemos uma pichação do tipo: “enquanto tu grita gol eles te exploram”, e por aí afora. A FIFA pune manifestações políticas nos estádios e o Tiago Leifert não gosta da mistura política e futebol. Entretanto, Eduardo Galeano já se ocupou de transportar o espaço delimitado pelas quatro linhas para outro patamar. Também, outras pessoas com densidade intelectual suficiente para desmistificar a ideia do futebol como o espaço próprio da alienação.
Há fatos interessantes na história do futebol brasileiro que aproximam o debate político do esporte. Ou, dito de outra forma, que levam o esporte para o debate político. A célebre Democracia Corintiana, do Dr. Sócrates e seus companheiros, a maneira peculiar com que o centroavante Reinaldo comemorava seus gols, a militância antirracista de muitos jogadores negros, a disputa do futebol feminino por espaço na ordem do dia do noticiário esportivo, tudo isso – e muito mais – representa um conjunto de manifestações que relativizam, de certa forma, os pensamentos limitantes acerca do futebol. Nesse contexto, aqui em nosso ambiente doméstico, um aspecto merece destaque: o crescente interesse político de alguns grupos ligados ao Inter e ao Grêmio, entre outros torcedores de times no Estado e no país, com destaque para as Frentes Antifascistas que se consolidaram nos clubes nestes últimos anos. E é justamente aqui, onde se estabelece um marco para o tema que pretendemos tratar, propomos outra pergunta: é necessário transcender os limites da paixão clubística para legitimar um discurso político que busca fazer o enfrentamento das questões políticas e sociais de maior amplitude?
Definindo a nossa posição, a primeira resposta é taxativa: NÃO! Naturalmente, é preciso dissecar melhor o tema.
Há marcas históricas distintas na maneira de torcer dos públicos gremista e colorado. Há histórias distintas nas construções das instituições. E há uma rivalidade única em nível nacional, muitas vezes elevada à condição de alavanca de tantas vitórias dos dois clubes. Em que medida uma união de esforços no sentido de denunciar e enfrentar preconceitos e fascismo pode afetar a maneira de torcer de suas gentes? Mais: a maneira de torcer pode afetar os esforços para o combate aos preconceitos?
Andou se falando em micro fascismo interior entre grupos de torcedores antifascistas, ao se tratar de uma suposta incapacidade de superação das barreiras da paixão pelo clube ao se fazer o enfrentamento de um problema que excede os limites do esporte mas que, no âmbito de ação dos nossos grupos, está intrinsecamente ligado às arquibancadas, ao disputar os corações e mentes das pessoas que as frequentam, torcedoras e torcedores em seus diferentes níveis de organização e consciência política. Não é aceitável atribuir a ideia de manifestação de um pensamento fascista não resolvido internamente a alguém que exponha em níveis mais passionais a rivalidade que vivemos cotidianamente no futebol riograndense. E não se confunda passionalidade com violência. Dentro das esquerdas continuadamente se debate a perda de capacidade em falar com o povão das vilas e periferias. Um dos motivos pode ser o debate excludente, vide expressões típicas da academia como essa do micro fascismo interior. Outros motivos podem ser aqueles de se supor um ser militante superior, despido de todos os preconceitos e desconstruído ao extremo. Uma irrealidade!! Ainda mais quando se pensa no ambiente do futebol. Para se combater o fascismo nas arquibancadas, os agentes necessitam debater diretamente com as pessoas que lá estão, com toda suas cargas emocionais e culturais. O que é mais caro para nós, Colorados, nesse momento? Dar embate ao ataque contra a classe trabalhadora, enfrentar o fascismo que cresce a olhos vistos, incluindo a homofobia constante em nossas arquibancadas, lutar contra a elitização no Beira Rio e contra a criminalização das torcidas, ou ser o desconstruído das redes sociais, soterrar os sentimentos de rivalidade mais entranhados no futebol brasileiro e com isso ser o antifascista do mês? Mesmo que isso prejudique a caminhada dentro do teu campo de luta, as arquibancadas do Beira Rio? Não é preciso responder.
Frente Inter Antifascista