Nota: fiquei um período sem publicar por motivos pessoais, que envolvem trabalho e mestrado. A partir de agora voltamos com a coluna, com a diferença de que será mensal, e não quinzenal.
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A precariedade técnica do cinema brasileira já foi assunto forte no campo cinematográfico nacional, em especial nos anos 1960, com a voga do Cinema Novo, principalmente na figura de Glauber Rocha. Uma cena mal gravada ou o áudio mixado de maneira inadequada era visto como indício social da miséria brasileira, em correlação com os equipamentos de ponta dos centros americanos e europeus, na lógica do desenvolvimento desigual e combinado do capitalismo.
Este aspecto está presente no filme de Reichenbach, e talvez daí advenha uma certa ironia jocosa que paira sobre as cenas. A todo instante os personagens interagem como que forçando uma interpretação (por parte dos atores), e o áudio de suas falas é gravado em separado da cena, dando a impressão de dublagem. Dublagem da própria língua, esta aí algo eloquente. Esse deboche, como indicando a impossibilidade da seriedade no cinema nacional, vem da tradição da pornochanchada, gênero forte na história do cinema brasileiro.
Já alguns absurdos, mas que não rejeita por isso a estética realista, tal como o Cinema Novo e toda a Nouvelle Vague, se filia à acumulação do cinema marginal, que vigora pouco tempo, desde meados dos anos 60 aos 70. O resultado é um filme que faz questão de se mostrar como algo estético, um produto criado ficcionalmente, e que contém aspectos interessantes da história nacional, em especial a luta da esquerda contra a ditadura militar de 1964.
Encarada com ironia, o filme faz troça da derrota esquerdista, contrapondo-se assim ao Cinema Novo, que via a revolução socialista como algo real e possível. No fim das contas, Alma Corsária é um ótimo filme que retrata parte da sociedade brasileira alheia à conjuntura política, lembrando no conteúdo o fraco filme A febre do rato.
Rodrigo Mendes