A falsa subversão em A febre do rato

A febre do rato é aquele típico filme cuja censura é 18 anos e foi feito para chocar. Escatológico, nojento, intenso e violento, ele se pretende subversivo em vários aspectos, do sexual ao político, e nos apresenta, digamos, o lado B da capital pernambucana, Recife.

O longa é dirigido pelo bom diretor Claudio Assis e seu ano de lançamento é 2013 – uma coincidência interessante ser contemporâneo exato às Jornadas de junho, movimento popular massivo que em muitas partes do Brasil saiu às ruas em protesto ao alto custo da passagem de ônibus, aos mega eventos como a Copa do Mundo, entre outras pautas populares. Assis já era conhecido por outros dois longas ao menos, a saber: Amarelo manga, de que ouvi elogios embora não tenha visto, e Baixio das bestas, que é interessante mas já carrega traços muito fetichizados de violência.

O fetiche, aqui, tem a ver com a supervalorização do sexo, fazendo questão de mostrar a todo momento genitálias, em especial as femininas, num movimento já esperado de machismo. O enredo gira em torno de um grupo de jovens adultos que aparentemente só bebem e fumam, praticam o amor livre e, um deles, escreve poesia (que fique um aviso, aqui não há nada de moralismo, como poderia parecer; se trata de uma descrição sumária). Este é interpretado pelo melhor ator brasileiro em atuação, na minha opinião: Irandhir Santos. O elenco ainda conta com outras figuras conhecidas, como Cazarré, Nashrergale, e outros.

O filme presta um desserviço à ideologia política chamada anarquismo, porque esta, desde seu surgimento na segunda metade do século 19, no seio da classe operária europeia, prega a organização coletiva, a responsabilidade pessoal dentro de uma coletividade maior na qual todos os indivíduos são livres e exercem seus direitos e deveres, respeitando as decisões comunitárias, sem hierarquia alguma. No entanto, o que o filme mostra como anarquismo é na verdade um grupo de desocupados, sem responsabilidade coletiva; o personagem principal, o poeta, é de um personalismo e egoísmo sem limites, e o máximo de “subversão” que pretendem é ficar pelados recitando poemas contra as agruras do capitalismo numa parada de 7 de setembro.

Seria errado não reconhecer que isto tem um grau, mesmo que baixo, de subversão. Mas é o tipo de ação circular, que não encaminha para um futuro, para uma reivindicação popular (já que todos no filme são de classe baixa), mas pelo contrario retorna para eles próprios, como bajulação do próprio ego “subversivo”.

Ao fim e ao cabo, um filme que banaliza uma ideologia política que prega a igualdade para todos de modo responsável; um longa que prefere fetichizar o sexo, sempre sob uma ótica machista, ao invés de aprofundar personagens complexos que renderiam bons comentários psicológicos; uma obra que, ainda sim, é representativa de parte da sociedade que prefere se manter apartada e preocupada apenas com seu umbigo do que com a sociedade como coletividade.

O filme de Assis dá pano pra mangas.

Rodrigo Mendes