Na terça-feira (28), a comunidade do Morro do Mocotó organizou uma manifestação no pé da comunidade, na região central de Florianópolis, ao lado do túnel Antonieta de Barros, importante via que liga às pontes que dão acesso à Ilha. O protesto foi realizado com cartazes, palavras de ordem e o trancamento das duas direções da rua Silva Jardim com barricadas de fogo, motivado por sucessivas ações policiais recentes que resultaram em jovens mortos na comunidade.
Segundo os moradores, nas últimas duas semanas foram três execuções policias na região. Um jovem do Morro do Mocotó, Jonatan Cristhof do Nascimento, de 23 anos, e dois jovens no Morro da Perla, Leonardo Leite Arruda Alves, de 18 anos, e Marlon Leite Arruda Alves, de apenas 15 anos de idade. As denúncias ainda dizem que a polícia fez as operações sem identificação e que foram execuções sumárias, sem nem mesmo identificar os jovens.
Assim, a comunidade decidiu tomar as ruas novamente para divulgar seu luto e também sua luta contra a brutalidade policial. Frente à urgência da situação, a manifestação foi realizada apesar do contexto crítico relacionado à pandemia de coronavírus. No ano passado, manifestações similares foram organizadas no Morro do Mocotó e lograram trazer um alívio momentâneo à região, porém os ataques e mortes voltaram a acontecer.
O problema é sistêmico na região, assim como na maior parte das comunidades populares e periféricas da Grande Florianópolis. Situações similares a essas motivaram as comunidades a organizar, no início de 2019, uma audiência pública sobre o tema da violência policial na Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina. Na ocasião, em presença do comandante-geral da Polícia Militar, Araújo Gomes, e do comandante da Guarda Municipal de Florianópolis, Ivan Couto, vários relatos de brutalidade foram apresentados por representantes de periferias, população em situação de rua e povos indígenas. As autoridades disseram, na ocasião, que os casos devem ser investigados, embora as comunidades reiterem que são raras as consequências práticas das investigações realizadas pelas próprias corporações.
Nesta semana, uma moção foi aprovada na ALESC pedindo ao Governador do Estado, Moisés (PSL), ao Secretário de Estado da Segurança Pública, e ao Comandante Geral da Polícia Militar, Araújo Gomes, por “urgente mudança na política de abordagem e de combate ao crime nas comunidades de periferia”, sobretudo no Morro do Mocotó.
A manifestação de ontem foi acompanhada de perto pela Polícia Militar de Santa Catarina. Um helicóptero sobrevoou o morro, membros da PM estavam armados com fuzis e ameaçavam os manifestantes. A comunidade respondeu com um chamado urgente por divulgação, realizada através de uma live no Instagram que foi assistida por mais de 100 pessoas, além da contribuição de mídias populares parceiras da comunidade. O ato contou também com o apoio de representantes de movimentos sociais e grupos de direitos humanos da cidade.
Apesar do clima de tensão criado pela polícia, o ato aconteceu com tranquilidade e permitiu que diversas pessoas da comunidade usassem do microfone para fazer a denúncia das brutalidades que seus parentes e amigos sofreram, assim como reivindicar por suas vidas e pela dignidade da comunidade. Ao final do ato, a comunidade caminhou até o alto do Morro do Mocotó, onde uma assembleia decidiu por novas ações nos próximos dias. Entre as propostas, um ato-intervenção com cruzes colocadas na praça em frente ao morro que acontecerá na próxima segunda-feira (04), às 17h.
No mesmo dia à noite, já apareceram relatos nas redes sociais de retaliação dos policiais, que voltaram a agredir e torturar moradores da comunidade que participaram do ato. O Morro do Mocotó pede a toda a sociedade apoio na divulgação de suas denúncias e reivindicações, pelo fim das mortes, opressão e pelo direito a uma vida digna.
As fotos e vídeos são de Gabriel Amado.