Desde o dia 18/03, a Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), tradicional instituição de ensino da região metropolitana de Porto Alegre, cancelou os eventos presenciais, reduziu os horários de atendimento e migrou todas as suas atividades acadêmicas presenciais para a modalidade à distância, em uma sobrecarregada e instável plataforma virtual.
A mudança, feita sem nenhuma consulta nem a professores nem aos estudantes, se deu devido à crise da pandemia do novo Coronavírus e, segundo a Universidade, deve se estender até a primeira semana de Abril.
No entanto, diante dos impactos brutais da crise na renda da maioria das famílias brasileiras, muitos estudantes têm enfrentado muitas dificuldades tanto para acessar os conteúdos virtuais, devido a problemas técnicos ou falta de tempo, quanto para cancelar as cadeiras visando não comprometer ainda mais a renda.
A Universidade, porém, segue impondo sua rígida política de cancelamento das atividades, não devolvendo os valores pagos até o momento do cancelamento e ainda cobrando 20% do valor restante.
Dificuldades dos estudantes
Para não serem obrigados a pagar mais taxas à Universidade e para não serem prejudicados na trajetória acadêmica, muitos alunos têm se esforçado para conciliar trabalho ou isolamento social com a realização das cadeiras à distância.
As plataformas virtuais, criadas às pressas pela UNISINOS e pouco explicadas para os alunos, tem apresentado constantes problemas, inadaptações ou sobrecargas, ficando fora do ar ou dificultando o acesso de muitos estudantes.
Mesmo para quem tem conseguido acompanhar as disciplinas, o nível de exigência que os professores têm cobrado e as complicações emocionais e econômicas que a pandemia tem trazido estão sendo fatores que dificultam o bom aproveitamento das aulas.
“Tem professores fazendo cada videoconferência valer nota. É trabalho valendo nota todos os dias, textos pra gente se inteirar. Ninguém consegue dar conta disso tendo filho, família, casa pra cuidar e ainda preocupação com as contas no fim do mês”, desabafou, nas redes sociais, uma estudante de Relações Internacionais no Campus de São Leopoldo. “Não tem como ter toda essa cobrança nesse momento tão delicado […] tá tudo muito incerto”, comenta uma colega.
Relatos de angústia, desespero e ansiedade têm se acumulado em grupos de whatsapp e fóruns nas redes sociais, diante das atitudes que parecem querer manter a normalidade para continuar cobrando o mesmo valor dos alunos.
“A realidade é que tanto nós quanto os funcionários estamos só realizando tarefas, sem real valor pro nosso aprendizado. O Moodle [ferramenta de aprendizagem virtual] não tá nada bem, e as supostas aulas estão muito confusas. É até violento com pais e mães de família, já passando dificuldade, que se concentrem pra ter aula à distância ou paguem multa pra não perder o semestre”, relatou um estudante de Porto Alegre, que aceitou compartilhar sua fala, mas não quis se identificar.
A UNISINOS não ofereceu alternativas para estudantes que não tem a possibilidade de acessar a internet nem esclareceu qual suporte técnico e financeiro tem sido disponibilizado aos professores para a manutenção das aulas, enquanto os boletos de mensalidade não são alterados.
Reações
O Diretório Central de Estudantes (DCE) da UNISINOS abriu, em sua página no Facebook, um espaço para que os alunos manifestassem suas demandas e compartilhassem sua situação diante das alterações propostas pela Universidade. “Se ninguém tá aprendendo e tá todo mundo prejudicado, melhor que se cancele o semestre”, se lê em um dos comentários.
O Centro dos estudantes de Psicologia publicou uma “Carta Aberta” onde os alunos exigem a possibilidade de cancelamentos das cadeiras sem multa, redução imediata do valor das mensalidades e um posicionamento quanto à suspensão das aulas:
“Uma pandemia, além de efeitos emocionais, traz um comprometimento grave na renda da maioria de nossas alunas e alunos, que são estudantes-trabalhadoras e que se veem, nesse momento, em uma situação caótica, complexa e potencialmente desastrosa, que tem inviabilizado a continuidade do semestre de forma proveitosa, academicamente falando”, diz o manifesto, que cobra um “um gesto de compreensão da universidade que nós sustentamos diante de uma situação que é grave e atípica para todas e todos”.
Outros coletivos, diretórios e movimentos de estudantes da UNISINOS e de outras instituições privadas, que também passam por situações parecidas em Porto Alegre e no Estado, devem aderir às campanhas e pressionar os reitores por respostas mais concretas diante da pandemia que já mata quase cinquenta pessoas no país.
A União Nacional dos Estudantes (UNE), no entanto, ainda não aderiu a pedidos de suspensão de aulas e o Ministério da Educação (MEC) do Governo Federal tem respaldado as ações como as da UNISINOS, de transferir integralmente às atividades presenciais para plataformas à distância, mantendo mensalidades no mesmo valor.
Mesmo assim, alunos têm se organizado para tentar pressionar a Universidade e expor as demandas, principalmente de estudantes bolsistas, mães e pais com crianças em casa e alunos que não tem sequer acesso a internet à disposição.