“Enquanto te exploram, tu grita gol”. Era uma vez uma pichação com esses dizeres na entrada do túnel da Conceição, em Porto Alegre. Talvez fosse uma resposta dada em 2014: um país onde parte significativa da população não tem acesso à educação, saúde ou saneamento básico receberia uma Copa do Mundo, com todo o custo que o evento acarreta, desde contrapartidas obrigatórias feitas com dinheiro público até práticas higienistas nas cidades-sede. Durante muito tempo, o futebol foi associado à alienação, o Panem et circenses pós moderno (pão e circo), e o surgimento de torcidas progressistas ainda surpreende muita gente ao mesmo tempo em que resistimos ao famigerado “futebol e política não se misturam”. Daí a necessidade e importância de participar, enquanto torcida de futebol, de marchas e manifestações populares. Se o futebol é do povo, e o povo tá na rua, por que a torcida não vai estar?
Um protesto sai às ruas para incomodar, cutucar a acomodação de parte da sociedade e chamar a atenção sobre situações que estão ocorrendo e nem sempre são noticiadas da maneira adequada, principalmente pela grande mídia. Ao quebrar o silêncio – não só o individual, mas de uma comunidade ou grupo – e mostrar que existem pessoas que se importam, ainda que atuando através de movimentos oriundos das arquibancadas, as torcidas progressistas reaproximam o futebol do seu espírito popular. Quando inserimos as cores de um clube no meio de uma marcha, estamos utilizando a força do futebol e sua capacidade de comunicar a distintos grupos para incutir problemáticas sociais em grupos que – quiçá de outra forma nunca prestariam atenção no discurso (talvez por estarem gritando gol enquanto eram explorados). Ao mesmo tempo, atraímos torcedores (até mesmo de outros clubes) que por vezes se sentem sozinhos no mundo – sendo o mundo do futebol, por óbvio, reprodutor de problemas que ocorrem fora do estádio – e descobrem que sim, é possível gritar gol ao mesmo tempo em que se exigem melhores condições de vida, igualdade nas relações de gênero, criminalização de preconceitos e tantas pautas que transcendem fatores clubísticos ou políticos. Até porque torcedor também é trabalhador e quer se aposentar. Por nos remeter à paixão, pertencimento e alegria, o futebol é uma ferramenta poderosa de comunicação e inclusão, atraindo pensamentos semelhantes e disseminando informação de forma mais acessível.
Se hoje a política no Brasil se apropria das piores características de torcidas, como o fanatismo desenfreado, cantos violentos, xingamentos para o “outro lado” e até cores oficiais, é hora das torcidas se apropriarem da discussão política, e ela também deve ser feita na rua. Assim, a mesma voz que grita gol enquanto é explorada é utilizada para tentar acabar com as várias formas de exploração.
Movimento Grêmio Antifascista