Texto de Opinião da Tendência Libertária Resistência Popular- Paraná
Uma breve análise da ocupação da Assembléia Legislativa por servidores públicos do Paraná
É manhã ensolarada e fria em Curitiba. Após 15 dias em greve, sem respostas dignas do governador Ratinho Junior, os servidores estaduais do Paraná de várias categorias do serviço público (educação, saúde, segurança, serviço social, entre outros) se viram diante de um empasse. Os motivos são justos e é justo tentar entender o que ocorre no momento em que decidem ocupar a Assembléia Legislativa do Estado do Paraná.
Na área da educação, por exemplo, a rotina de trabalho é extremamente desgastante, uma vez que há a crescente pressão por resultados, como o aumento do IDEB das escolas, em simultâneo a um cenário de cortes de gastos representado nas turmas lotadas e o número reduzido de trabalhadores. Como todos os servidores, os professores estão há quase quatro anos sem reajuste salarial previsto em lei, com uma perda de poder de consumo que chega a 17%, segundo a APP-Sindicato. Professores estão adoecendo e relatos de suicídio de colegas de trabalho são cada vez mais frequentes.
Este ano, de forma impositiva e sem consulta prévia a comunidade docente, a Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED) determinou o uso dos chamados Descritores de Aprendizagem, baseados no sistema de avaliação SAEP (Prova Paraná) que busca avaliar “os conhecimentos desenvolvidos ao longo de uma etapa do ensino e procura detectar as dificuldades de aprendizagem” (conforme http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/saep/portugues/saep_port_9ef/index_por9.html, acessado em 13/06/2019). Objetiva avaliar ainda uma série de metas cognitivas a serem atingidas pelos estudantes nas disciplinas de Lingua Portuguesa e Matemática, assessoradas pelas demais disciplinas do currículo escolar. Baseada na pedagogia das Competências e Habilidades, proposta pelo economista Jacques Delors (UNESCO, 1998, p. 3-4); baseada também na Base Nacional Curricular Comum e no documento Um Ajuste Justo do Banco Mundial, este formato de política educacional busca a formação de uma força de trabalho mais coesa e flexível, onde os trabalhadores formados por esta concepção estariam adaptados a se ajustar com facilidade a diferentes profissões e atividades profissionais, com ênfase no desenvolvimento de competências como as de “eficiência social” e a “competência gerencial” (FARIA,2014). As experiências desta concepção pedagógicas aplicadas nos Estados Unidos, durante a década de 1990, deram ênfase a uma formação voltada a um perfil de competitividade e produtividade cada vez maior entre educadores e entre educandos, trazendo a lógica concorrencial da empresa para a escola, espaço de aprendizado (Op. Cit.).
Na Coréia do Sul, um dos países pioneiros nesta metodologia e, historicamente, um dos primeiros colocados no ranking do PISA, a extrema pressão por bons desempenhos nas provas escolares e o intenso clima de concorrência entre os estudantes provocou uma das maiores taxas de suicídio de jovens entre 15 e 29 anos, chegando a 30 casos por 100 mil habitantes nesta faixa etária (Conforme: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-39672513 Acessado em 13/06/2019), taxa esta que vem subindo também no Brasil, 10% desde 2012, chegando a 5,6 a cada 100 mil habitantes (Op. Cit.)
A imposição de resultados padronizados em escolas públicas será desastrosa em vários sentidos. Temos realidades bastantes distintas entre nós, ainda mais em um estado grande e diverso, como é o Paraná. Não é concebível, pedagigicamente, que educandos vindos do campo, da cidade, indígenas e escolas itinerantes sejam obrigadas a responder pelos mesmos descritores de aprendizagem. Impor, por exemplo, a escolas de comunidades indígenas (que falam diversas línguas, entre elas o guaraní) uma nota que a classifique entre as escolas do Paraná onde o critério é o domínio da língua portuguesa e matemática é violento e racista de tantas maneiras que não há espaço para descrever aqui. Esta política reforça as desigualdades regionais, étnicas e sociais do Paraná.
Neste sentido o PL/04/2019 é muito perigoso para a educação pública paranaense. Ele congela a carreira de todo o funcionalismo público do executivo paranaense (Legislativo e Judiciário estão fora da mudança), cortando vários direitos, como vale transporte. Além disso tem-se vários direitos já retirados, como a hora-atividade dos professores, redução do porte de escolas, aumento da jornada de trabalho das pedagogas e os precários contratos dos trabalhadores temporários (PSS) que terão agora que se submeter a provas anuais e contratos ainda mais degradantes de sua condição profissional.
Tendo em vista este quadro, os servidores, que aguardavam desde às 9 horas da manhã na praça Nossa Senhora de Salete alguma manifestação do Governador em atender suas reivindicações, e após a lamentável fala do Deputado Ricardo Arruda, do PSL, onde este referiu-se aos servidores inclusive como vagabundos, ocuparam a Assembléia Legislativa e dizem só sair de lá quando tiverem uma resposta do Governador ante suas reivindicações. A ocupação é legítima e diz respeito não só aos servidores em greve, mas a fração mais pobre da sociedade, que depende dos serviços públicos. Ocupar e resistir é o lema dos servidores neste momento.