Na tarde desta terça-feira (17), professores (as) indígenas que lecionam em aldeias do estado do Paraná ocuparam a sede da Secretaria Estadual de Educação (SEED).
O protesto foi contra as mudanças impostas pelo secretário Renato Feder ao Processo Seletivo Simplificado (PSS), que traz mudanças prejudiciais ao ensino nas aldeias, desrespeitando a autonomia e os costumes das etnias. Ainda na noite da terça-feira, o governo recuou e revogou parte do edital Edital 47/2020 PSS 2021. Depois de algumas horas de ocupação, os indígenas foram atendidos por representantes do governo, que assumiram o compromisso (veja a ata da reunião abaixo) de revogação do edital que trata da contratação.
Durante a reunião, a SEED retirou as partes do edital que obrigavam os professores indígenas e quilombolas a realizarem a prova e pagarem a taxa de R$ 60,00 por disciplina de inscrição, prometendo novo edital para dezembro.
Professores que não se enquadram na educação para aldeias indígenas e quilombolas ainda aguardam, em acampamento no Centro Cívico, novas decisões que podem sair na quarta (18).
Abaixo, as informações da ocupação que foram trazidas pelo Parágrafo 2
Uma reunião marcada para a data de hoje, com representantes do governo, desagradou toda a classe de docentes. O governo não cumpriu compromissos firmados desde a greve de 2019, além disso, o secretário da educação, Renato Féder, não compareceu à reunião. Dentre todas as reivindicações, está a mudança da contratação dos professores temporários, que colocará, em plena pandemia, mais de 90 mil profissionais para executar uma prova que os manterá no mesmo sistema precário de contrato, além da cobrança de taxa de inscrição de R$ 60,00 reais por disciplina. O edital 47 também deixa de fora professores que se enquadram no grupo de risco, condenando milhares de profissionais ao desemprego no ano letivo de 2021, além do fechamento de cerca de 400 turmas do ensino noturno nas escolas “cívico-militares”. Educadores e educadoras de todas as regiões do estado pedem uma assembleia para deflagrar uma greve geral na educação pública já nos próximos dias.
Ao Parágrafo 2, os indígenas informaram que a Polícia Militar chegou na noite da terça-feira à SEED, o que trouxe um clima de apreensão à ocupação. Confira abaixo a nota de repúdio da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul) contra as mudanças no PSS:
Manifesto dos Povos Indígenas do Paraná contra os retrocessos na educação escolar indígena
Os Povos Indígenas do Estado do Paraná repudiam ações que o governo vem fazendo sem respeitar os seus direitos e por não considerar as leis que asseguram o direito a consulta, livre, previa e amplamente informada às comunidades escolares e lideranças que vem por longos anos lutando por uma Educação Escolar Indígena diferenciada e de qualidade. Qualquer atitude que viole os direitos dos Povos Indígenas, principalmente frutos de suas próprias lutas é entendido com uma ação que está retrocedendo todas as conquistas e reconhecimento constitucional e em outros regimentos como exemplo a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas e Convenção 169 da OIT.
Nesta ocasião referimos a um processo recente que poderá ocasionar graves impactos na vida cultural, social das comunidades indígenas deste Estado. Foi lançado um edital para PSS (n°47-2020-GS-SEED) com muitas mudanças, alterações e restrições que pode trazer diversos transtornos na atuação dos profissionais indígenas de educação e para toda comunidade escolar que ainda poderá comprometer sobretudo a política educacional diferenciada pois deve respeitar as especificidades e diversidades das populações indígenas.
A SEED disponibilizou um link para alguma impugnação referente ao Edital, mas que não atende os reais contestamento que seria necessário fazer. A questão é bem mais complexa no contexto dos direitos na Educação e das Escolas Indígenas.
O Governo deverá levar em conta que é essencial que reconheça a presença indígena no Estado e suas complexidades culturais, suas organizações sociais e sua territorialidade, devendo portanto assegurar todos os seus direitos em qualquer ato que envolva questões sobre suas vidas Ao tramitar entre os territórios indígenas, sobretudo nas escolas um processo seletivo que sofreu diversas alteraçoes, sem nenhuma consulta, discussão e informações com os principais interessados e envolvidos o governo violou princípios dos direitos que asseguram que os Povos Indígenas devem consultados previamente, dando aos mesmos a oportunidade de discutirem amplamente sobre seus futuros no que o Estado apresenta nas suas demandas político administrativo.
Diversos educadores, pesquisadores e outros profissionais em conjunto com as lideranças indígenas da educação escolar e lideranças tradicionais se empenharam por muitos anos para construir uma política educacional que respeite e aceito as formas diferenciadas de ensinar e aprender dos Povos Indígenas. Muito distante ainda do Estado reconhecer de fato essas especificidades mas foram dados vários passos importantes e positivos e não deve retroceder nessas conquistas. Por muitos anos o Estado agiu de forma colonialista e intervencionista na educação e na escola nos territórios indígenas reprimindo e proibindo as maneiras próprias da vivência indígena, na tentativa de “integrar” o índio na sociedade. Com muita resistência passaram essa fase de opressão contra sua língua, contra sua cultura, contra sua sua fé, contra sua maneira própria de saber, ensinar e aprender e chegaram até aqui com muitas experiências de descolonização da escola e da educação. Não respeitar isso é uma tentativa recompor o sistema colonizador e integracionista nas comunidades indígenas.
Portanto a luta é para fazer valer todos os direitos conquistados a começar pela obrigação constitucional do Estado consultar os Povos Indígenas sobre o que fazer, como fazer e quando fazer as ações que diz a seu respeito. O anseio dos Povos Indígenas é de avançar objetivando potencializar cada vez mais a educação diferenciada porém de muita qualidade. E isso a comunidade escolar e suas lideranças sabem propor e fazer mas é necessário respeitar suas autonomias.
Vale ressaltar também que os territórios dos Povos Indígenas são muitos visados pelo neo-desenvolvimentismo. Muitos enfrentam constantes ataques físicos ou psicológicos devido sua raça e seu jeito próprio de viver. No Paraná essa situação tem fortes agravantes em alguns locais específicos como no oeste. São muitos casos de racismo e discriminação acirrada com os indígenas e pouca providências judiciais tomadas contra esses crimes. No entanto com essa questão que o Estado pretende de implantar escolas cívico-militares a preocupação tomou conta em geral das lideranças indígenas de todo Estado. Todos sabem que a maiorias das escolas indígenas ofertam o ensino inicial, (educação infantil, anos iniciais do fundamental) boa parte até os anos finais do fundamental. Em várias aldeias já conquistaram até o ensino médio. Mas nesse sentido também a comunidade escolar e os estudantes sentem inseguros da manutenção ou não já que muitas mudanças e perda de direitos estão acontecendo. Depois os jovens indígenas são obrigados a irem pra cidade na tentativa de continuarem seus estudos e neste momento é que sofrem muitos impactos culturais mesmo que o ambiente não tolere formas de segregação e preconceitos. É que verdade o ambiente escolar fora da aldeia não ta preparado para lidar com a diferença cultural e o jovem poderá sentir oprimido e abandonar os estudos ou se desvincular culturalmente de sua comunidade e Povo. Por isso uma bandeira de luta do movimento indígena é para ampliar a oferta de ensino até o médio,se possível, em todas terras indígenas.
Diante de todas essas preocupações nós Povos Indígenas do estado do Paraná manifestamos nosso repúdio de como foi conduzido o edital do PSS e outras ameaças previstas para os trabalhadores indígenas da educação.
Dessa forma não aceitamos que deem andamento no processo seletivo sem ampla discussão sobre todos os pontos que possam fortalecer ou que podem trazer grandes prejuízos sociocultural.
E não aceitaremos por razões históricas que nossos jovens sofram novamente numa escola que trate seus estudantes com regras intervencionista militar.
E Educação Escolar Indígena deverá ser cada vez mais fortalecida e não retrocedida. Exigimos o cumprimento da Convenção 169 da OIT.
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