Pelo título o leitor perceberá que o texto é uma sugestão um pouco atrasada, já que o natal já passou. Mas como ainda estamos no clima natalino, independente se o cultivamos ou não, acho que vale a pena.
O bebê de Rosemary é um clássico filme de Roman Polanski. Quem é esse diretor? É um cineasta polonês que fez filmes em vários países e, imerso em polêmicas de sua vida pessoal, segue ambivalentemente até hoje. Seu começo – e boa parte do que o tornou conhecido – é caracterizado por uma estética delirante, onírica, escatológica em certa medida (isto é, nojenta, grotesca, etc.). Seus filmes, dos que vi, são sempre muito violentos, e essa violência não é fetichizada, explícita, é construída muito mais no psicológico que por imagens que só chocam.
Polanski, em sua vida pessoal, que deve ser separada de sua obra, é um canalha. Ao menos é o que parece ser. Eu conheço pouquíssimo sobre as acusações de abuso sexual que o diretor foi alvo, mas sabendo que esse tipo de violência é naturalizada e infelizmente corriqueira, e levando em conta que são muitas denúncias, certamente Polanski é culpado, e sendo assim deveria estar preso. Ele inclusive chegou a ficar expatriado e impedido de voltar para algum país que eu não sei qual é… Polanski, mais que Woody Allen, é o paradigma da discussão de vida e obra, a qual não entrarei aqui pelo espaço do texto, mas que já apontei minha opinião. Fazer a separação não significa não enxergar as violências de suas obras, mas entendê-las como aspectos estruturais de uma sociedade que estão representadas de jeito ou de outro na obra, ou seja, nos filmes.
O bebê de Rosemary é o segundo da trilogia chamada Trilogia do Apartamento, que começa com Repulsa ao sexo (1965), nosso filme em questão, que é de 1968, e termina com O inquilino, de 1976. O longa, estrelado por Mia Farrow, é uma incursão na loucura, no delírio, no sonho de ter um bebê e o pesadelo de sua gestão até o nascimento. Farrow, dirigida por Polanski, encara muito bem esse papel, numa neurose cheia de tensões e violências. O filme conta com todo aquele clichê de vizinhos bons demais que causam desconfiança; um apartamento de elite, enorme para um casal, com quinas assustadoras e peças esquisitas; um livro de magia e uma morte prematura de um amigo da protagonista que instauram o grande mistério do filme.
O filme é todo construído em cima de ambiguidades, elemento central para o suspense. A sequência final é arrasadora, muito bem filmada, criando uma atmosfera surreal, assustadora, e com toda certeza disfórica, abrindo caminho a interpretações dos telespectadores. Sem dúvida um grande filme, e que parece combinar com essa época natalina.
Rodrigo Mendes