O texto abaixo é opinião de um professor da rede estadual de educação de Joinville (SC)
Na noite da última terça-feira, 16, cerca de 800 professores da rede estadual de ensino de Santa Catarina se encontraram virtualmente para debater a greve em defesa da vida, deflagrada pela categoria em outra assembleia, na sexta-feira, dia 12.
A data da assembleia foi tirada para essa data pois a direção do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado (Sinte) de Santa Catarina teria um encontro com o secretário da Educação, Vampiro (PMDB), durante a tarde do mesmo dia, para debater o retorno presencial das aulas. Com isso, a assembleia funcionaria para o repasse do debate com a Secretaria da Educação (SED).
Poucas horas antes da reunião, Vampiro e sua equipe de bajuladores se pronunciaram nas redes sociais justificando o cancelamento do encontro devido à decisão dos professores de deflagrarem greve.
O que o secretário fez apenas afirma a posição de que o governador Carlos Moisés (PSL) sempre representou: inimigo da educação.
Se fechar para as reivindicações de professores e estudantes não é novidade nesse governo, se alinhando aos seus aliados políticos que anteriormente governaram o estado.
Mesmo com um discurso supostamente técnico, menos truculento do que Jair Bolsonaro, Moisés e seus aliados — toda a velha política catarinense —, fortalecem o desprezo pelas vidas. Os infelizes dados de contaminação, de mortes e de ocupações dos leitos de enfermarias e UTIs mostram isso.
E a abertura das escolas tendem a reforçar essa trágica situação. O governo busca a todo custo quebrar uma das últimas barreiras que lembra diariamente que estamos vivenciando uma pandemia, que é mal gerenciada pelos governos federal, estadual e municipal, causada por um vírus que se propaga cada vez mais rápido devido suas variantes.
Moisés, Vampiro e demais políticos e empresários da educação privada que pressionam pela volta às aulas presenciais não estão preocupados com o direito à educação, muito menos com as dificuldades das famílias em relação aos cuidados com as crianças e adolescentes.
Se de fato isso fosse preocupação do governo, a Polícia Militar não causaria uma “epidemia” de execuções, inclusive de jovens em idade escolar; formas de assegurar renda aos mais pobres seriam garantidas; vacinação de fato seria prioridade; ou formas de não penalizar estudantes que não conseguem acompanhar o ensino remoto seriam melhor debatidos, evitando reprovações e o abandono escolar.
O tema é complexo, envolve diversas questões, outros grupos, além dos professores, devem ser ouvidos. Porém, é inegável que abrir as escolas é uma escolha do governo de buscar reforçar uma “normalidade” que contamina, deixa sequelas físicas e psicológicas e tira vidas dos de baixo.
Um dos objetivos dessa decisão é normalizar o risco de contágio, ao mesmo tempo que o Estado se esconde em protocolos incompatíveis com a realidade das escolas, deixando o debate apenas na esfera moral da higiene individual, nos culpabilizando pela própria contaminação.
Depois de dar essas breves voltas pelas intencionalidades que permeiam a decisão de retomada presencial as aulas, é importante apontar onde Estado e a assembleia de terça-feira se encontram: além da resposta autoritária do governo, os professores tiveram que lidar com uma direção de sindicato pouco comprometida em organizar respostas com a categoria.
Em uma assembleia engessada, pouco aberta para base, dirigentes repetiram falas desmobilizadoras. Se na sexta-feira a greve era realidade aprovada pela maioria, quatro dias depois, deixou de ser possibilidade de defesa da vida dos professores, mesmo que o número de professores presentes tenha saltado de 500 para 800, na terça-feira.
O espaço que deveria funcionar para reforçar as garantias do direito à greve tanto de efetivos quanto de ACTs; aguçar as memórias de que só a luta muda a vida; fomentar debates sobre metodologias de como avançar na mobilização dos professores não convencidos a se juntar ao movimento. Afinal, greve se constrói.
Além disso, deveriam dialogar sobre o funcionamento de uma greve sanitária; buscar entender as dificuldades de uma greve no início do ano letivo, onde muitos ACTs se encontram sem vaga, podendo pensar alternativas para essa e outras questões.
Na realidade funcionou de forma inversa. A greve só foi pauta pois existia a necessidade de ser desmobilizada pela direção.
Se não fosse suficiente desmobilizar uma greve que nem teve início, propuseram uma nova assembleia apenas para depois de três semanas, no dia 8 de março. Literalmente estão aguardando professores se contaminarem para talvez iniciarem novas mobilizações.
Ao longo da assembleia, ficou nítido que para a direção do Sinte-SC todas as críticas são entendidas como formas de desestruturar a unidade da categoria.
Essa é mais uma crítica de um professor que busca na luta a transformação da sociedade, mas que não encontra sentido algum em causar a desunião dos professores.