O título deste texto é bastante amplo e não me proponho aqui, obviamente, a dissecá-lo. Decidi escrever sobre isso porque vi um post de Facebook que contrastava duas imagens: a primeira, uma foto amarelada em que só se via prédios, alguma fumaça, uma paisagem rarefeita; a outra, bem colorida, mostrava algumas construções e ao fundo o oceano, brilhando de azul. Pelo post ambas as fotos mostravam a Palestina, e a primeira era uma maneira caricata e etnocêntrica da Netflix, nas palavras do post, de representar as paisagens fora dos EUA. Pensei que renderia um bom texto esse assunto.
Um pressuposto é que nem sempre o cinema teve cores. Sabemos que até meados dos anos 30 os filmes eram somente em preto e branco, portanto, essa questão não estava posta. O cinema com as cores ganhou um elemento a mais que, quando bem usado, traz ganhos significativos – afinal, não dá pra imaginar os filmes da segunda fase do Kubrick em diante (a partir de 2001: uma odisséia no espaço, 1968) sem o seu uso magistral de cores.
Tomando como base os filmes coloridos, um recurso de uso de cores é a passagem do colorido para o monocromático, ao preto e branco, para representar um flashback, uma cena do passado, etc. Esse recurso é muito comum e amplamente usado, seja no cinema, seja na televisão em novelas. Ao fazer isso, a mudança de cor indica um sentido novo para aquela cena.
Outro uso de cores com função narrativa, ou seja, quando a cor cumpre um papel significativo no filme, e não meramente acessório, é um usado por Krzysztof Kieslowski em Não amarás e Não matarás: paleta de cor completamente amarelada aliada a um achatamento dos vértices do quadro (imaginemos que a tela do cinema não é um retângulo, mas sim que suas pontas são arredondadas e escurecidas). Isso causa uma sensação claustrofóbica, porque o quadro de imagem que vemos diminui e, por estar amarelado, causa uma sensação meio desconfortável no telespectador.
Um certo apagamento da claridade nas imagens também é um recurso pictórico (de cores) que interfere no sentido dado pelos quadros do filme. É exemplo disso o filme O passado, de Asghar Farhadi. Pouca claridade também cria um desconforto e parece indicar que há algo de nebuloso na trama, algo não dito, mas que é importante – e de fato é isso que acompanhamos no longa.
Não podemos esquecer o uso de uma paleta única de cores na época do preto e branco. Às vezes assistimos a filmes do Expressionismo Alemão e nos deparamos com um amarelado (como se botassem uma tela amarela, verde, azul ante a projeção). Na ausência de uma câmara que filmasse em colorido, aquilo parece um recurso para tentar distinguir cenários, cenas e momentos do filme. À noite, um azulado chapa a tela do filme; durante o dia, um amarelo, e assim por diante.
Hoje em dia é difícil pensar o cinema dissociado das cores, mas por um bom período foi assim. Atualmente vivemos o esbanjamento do colorido em megas produções, mas é preciso lembrar que algumas coisas em excesso perdem o sentido. Se usamos muita cor num filme, daqui a pouco estamos é banalizando esse recurso. O mesmo vale para todos os outros elementos fílmicos, como a trilha sonora, a fotografia, cenários, direção e atuação.
Rodrigo Mendes