Grupo de Pesquisa de Professores da Emef Morro da Cruz – Porto Alegre
O governo Marchezan respondeu de maneira muito equivocada à pandemia. Na educação, lançou uma plataforma de ensino on-line (córtex) sem nenhum diálogo com as comunidades escolares. Os professores viram logo de cara que a plataforma não proporcionava interação adequada para o processo de ensino-aprendizagem. As famílias logo mostraram que não tinham condições tecnológicas para utilizar esse meio. O grupo de pesquisa dos professores da Emef Morro da Cruz, em julho de 2020, havia conseguido contatar, via ligação telefônica, os responsáveis de 151 alunos, destes, apenas 14% tinham acesso a computador e internet residencial e quase 50% diziam ter apenas celular precário, sem condições de baixar aplicativos. Os professores tinham a hipótese de que justamente na parcela de alunos não contatados é que estaria a maior parte das famílias que tinham condições tecnológicas ainda mais precárias. Ou seja, a demanda da comunidade não era uma plataforma, mas sim iniciativas de democratização do acesso à tecnologia com a distribuição de aparelhos eletrônicos e internet. Nenhuma iniciativa desse tipo foi proposta até o fim do governo Marchezan.
Enquanto Marchezan anunciava a plataforma córtex como um “legado” para a cidade, os professores faziam esforços absurdos, utilizando seus recursos particulares, para contatar as famílias e saber as reais necessidades das suas comunidades escolares. Enquanto Marchezan e seu secretário de educação Adriano Naves faziam críticas chulas aos professores da rede pública, as famílias estavam apreensivas pensando em, antes de tudo, como colocar comida na mesa, mas também estavam apreensivas pensando em como garantir o acesso à educação de seus filhos com aparelhos precários divididos entre muitas pessoas (37% dos entrevistados tinham mais de 3 crianças no núcleo familiar, ou seja, as famílias eram numerosas).
A partir desta pesquisa realizada pelos professores da Emef Morro da Cruz, o corpo docente da escola mobilizou sua rede e lançou campanhas de distribuição de alimentos para a comunidade, já que o governo sumiu com o dinheiro da merenda e deixou as famílias desassistidas. 67% das famílias possuíam adultos em situação de desemprego, sendo que 49% dos entrevistados diziam ter membros da família que haviam perdido o emprego durante a pandemia. No decorrer do ano, essa situação de desemprego só se agravou e cada vez mais as pessoas diziam ter dificuldades de garantir alimentação. Enquanto isso, o governo Marchezan desmantelava a assistência social do município, não enviava cestas básicas para os CRAS e não encaminhava alimentos para distribuição nas escolas. Em 10 meses de pandemia, o governo mandou hortifruti em um mês e cestas básicas pequenas em apenas dois meses para as escolas. Além disso, não houve nenhuma política de auxílio emergencial municipal, nem nenhuma pressão para expansão e manutenção do auxílio emergencial federal.
Mais para o final do ano, Marchezan quis abrir as escolas “a toque de caixa” e abriu todo o resto da cidade junto. É isso que as comunidades demandavam? Essa abertura de tudo não refletiu no desemprego, mas refletiu na lotação dos ônibus, que continuaram com frota reduzida, e refletiu no aumento da ocupação dos leitos de UTI.
Marchezan foi enxotado da prefeitura. Agora temos no paço municipal Sebastião Melo com uma proposta muito similar a do homem branco anterior. Umas rugas a mais não mudaram a ideologia. O auxílio emergencial acabou e não está na boca dos governantes. Eles fecham os ouvidos para as demandas que realmente importam. Fecham os ouvidos e gritam, como crianças birrentas, que é preciso abrir as escolas, que é isso que o povo quer. Uma parte do povo quase acredita. Pensam “precisamos trabalhar, por isso precisamos ter onde deixar as crianças.” Fica a pergunta: essa seria uma demanda se os governos não tivessem fechado os ouvidos e tivessem oferecido assistência às famílias, tivessem garantido acesso à tecnologia, tivessem garantido segurança alimentar, tivessem garantido um auxílio emergencial digno para que as pessoas se mantivessem em isolamento?
Melo prometeu reabrir as escolas e está focado nisso. Está de cabresto! Fecha os ouvidos e os olhos para a realidade. Os professores avisaram que não era o momento de voltar às aulas presenciais. Já ouviram o ditado “quem avisa amigo é”? Pois bem, alguns pintam Melo como o herói e os professores como os inimigos. Mas vocês já viram herói que quer a morte das pessoas? Herói que propõe ao invés de salvar vidas, só aumentar o número de leitos para as pessoas caírem mortas? Os planos de Melo foram temporariamente barrados pelo anúncio da bandeira preta em Porto Alegre, confirmando o que os professores já avisavam: não é o momento de voltar. O argumento principal para reabrir as escolas era o de sempre “essa é a vontade do povo!”. Será mesmo? Após live transmitida pela página da Emef Morro da Cruz no Facebook – realizada com representação da saúde, da educação e da comunidade – foi lançada uma enquete, voltada aos responsáveis pelos alunos, sobre a volta às aulas, o resultado foi o seguinte:
Mais de 97% dos participantes da pesquisa reconheceram que há riscos no retorno presencial.
A grande maioria acredita que o melhor é não ter aulas presenciais.
O ano e o governo mudaram, mas tanto uma mudança quanto a outra são mudanças fictícias. Nada mudou. A pandemia não acabou, a vacina não chegou a todos e continuamos precisando oferecer assistência às comunidades das escolas municipais de Porto Alegre. Essa assistência precisa ser real, não fictícia.