Há menos de uma semana o Repórter Popular fez uma reportagem sobre a privatização dos equipamentos da cultura em Porto Alegre. Preocupado com o que deixará de marca na cidade, o Prefeito insiste nas parcerias público-privadas. E onde já existia precarização, a situação se agrava. É o caso da Saúde, setor em que milhares de trabalhadores receberam ontem, dia 17/09/2019, a notícia de que seriam demitidos em breve, inclusive com carta de agradecimento pelos serviços prestados.
Porto Alegre vive há tempos assombrada pela terceirização no setor saúde. Há alguns anos, uma investigação de corrupção coincidiu com o assassinato de um secretário da pasta, e posteriormente foi identificado um rombo de dez milhões de reais em recursos públicos. Com a saída do Instituto Solus, foi criado o IMESF – Instituto Municipal de Estratégia de Saúde da Família, uma empresa pública de direito privado, que contrata em regime celetista para execução do serviço público nas unidades de saúde. Desde sempre, os servidores públicos e outras entidades sindicais e profissionais cobram que estes serviços sejam feitos por funcionários de carreira, a fim de que isso estimule a estabilidade dos trabalhadores nos cargos, e a longitudinalidade da assistência. Ou seja: que os profissionais de saúde se mantenham em seu local de trabalho e conheçam as pessoas que atendem.
Porém, Marchezan tinha outro plano: explorar ainda mais os trabalhadores e garantir lucro para os empresários, vulgo “a melhor atenção primária em saúde do Brasil”. Como em outras áreas, investiu na piora dos serviços. Estabeleceu metas inatingíveis, reduziu período de planejamento da equipe, implantou novos sistemas de informação, e os agentes comunitários viraram assistentes administrativos, lotados de papéis para preencher, as equipes de enfermagem se revezam em tarefas de ofício e burocracia, e os médicos que ainda resistem são cobrados por atendimentos de não mais que 10 minutos.
E então, apareceu a oportunidade perfeita: o Supremo Tribunal Federal apontou a irregularidade do IMESF, e o Prefeito utilizou a decisão para culpar as entidades que defendem o SUS e os trabalhadores e divulgar sua obra: a entrada de Organizações Sociais na ponta da saúde de Porto Alegre. O formato já é executado em equipes de saúde mental e hospitalares.
A atuação sagaz do Prefeito, porém, coloca a pulga atrás da orelha do povo: como esse plano aparece como mágica, bem no momento em que são divulgadas 1800 demissões? Se eles sabem o que fazer, porque ainda não o fizeram com os recursos que a Saúde já tem? Ou farão sobrar dinheiro justamente com a demissão em massa, pela redução salarial dos mesmos trabalhadores ao serem contratados por nova empresa? Ou ainda, esta mágica tem a ver com a unificação de serviços recentemente denunciada? Entre as opiniões que buscamos, parece mais uma jogada de marketing pré-eleitoral, na conta do sofrimento e da exploração de quem cuida da saúde das pessoas todo o dia.
Do lado de cá, mais de 1800 pessoas convivendo com mais esta incerteza, desesperadas. Não bastasse a condição em que Marchezan tem deixado os servidores públicos, com ameaças e desvalorização, agora ataca mulheres e homens que assumem juntos a linha de frente dos postos de saúde da cidade. Não basta o ajuste e a repressão que enforca o povo com o aumento do custo de vida, agora se veem frente a frente com o horror do desemprego em tempos de crise.
O argumento, é o mesmo de sempre: o serviço público é ruim, o privado é bom. A diferença, na verdade, é que o serviço público tem, e sempre teve, administradores como este Prefeito e seus assessores. Basta ouvir os trabalhadores, que eles têm na ponta da língua o que precisaria melhorar.