O ato por justiça a João Alberto reuniu milhares de pessoas em Porto Alegre e, entre estas, estavam quilombolas de Porto Alegre. A Frente Quilombola do Rio Grande do Sul emitiu a nota abaixo sobre a luta contra o racismo e também contra os ataques sofridos pelos quilombos urbanos da capital que cotidianamente precisam enfrentar golpes do poder público, como a falta de condições dignas de vida e o acesso a direitos, e da iniciativa privada, que frequentemente tenta tomar os territórios quilombolas para ampliar empreendimentos imobiliários (caso do Quilombo Lemos, que enfrentou ações de reintegração de posse movida pelo Asilo Padre Cacique).
A Porto Alegre Afro-Indígena profunda e segregada esteve presente ontem no ato em memória e respeito ao Martírio de Zumbi, de João Alberto Silveira de Freitas e a 82 jovens negros(as) chacinados diariamente pela violência de Estado e o racismo/colonialismo que estruturam a nossa sociedade.
Os quilombos urbanos de Porto Alegre, permanentemente acossados pela violência colonial racista e pela especulação imobiliária, compareceram e disponibilizam para a família de João Alberto seus territórios para suporte e acolhimento, como rege nossa tradição. Ouçam as vozes profundas dessas Comunidades sintetizadas na faixa do Quilombo dos Machado:
BASTA, CHEGA DE RACISMO!
QUILOMBOLAS EXIGEM JUSTIÇA PARA JOÃO ALBERTO SILVEIRA DE FREITAS!
REPARAÇÕES PARA A FAMÍLIA!
BOICOTE NACIONAL AO CARREFOUR!
Ouçam Sandro Lemos, do Quilombo Lemos, denunciando mais uma ameaça de remoção do território ancestral para dar espaço ao cinza e impactado por projetos atendendo aos interesses da Especulação Imobiliária e do Racismo que tornou Porto Alegre a Capital mais Segregada do País.
Ouçam Geneci Flores, do Quilombo dos Flores, Luis Machado (Jamaica), da Comunidade 7 De Setembro – Quilombo dos Machados; Patricia Peres (Mãe Pati), do Quilombo Família de Ouro; Daiane e Angela, do Quilombo dos Silva. São vozes profundas de uma luta cotidiana pelo bem viver e que muito tem a nos ensinar.
Aos preocupados com vidraças, etiquetas e que cotidianamente passam pano e incitam a violência colonial/racista, vos digo que foi só um ensaio geral.
Do rio que tudo arrasta, se diz que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem
Bertolt Brecht
20 de Novembro, em Porto Alegre, no Carrefour Passo D’ Areia, onde na noite de 19 de novembro de 2020, os sonhos e a vida de um homem negro de 40 anos, João Alberto Silveira de Freitas, foram retirados e interrompidos pelo racismo recorrente há 520 anos. Neste mesmo dia, há quase quatro séculos atrás, se dava o martírio de Zumbi; e no Brasil profundo, o martírio de 82 negros e negras chacinados diariamente, principalmente jovens, foi lembrado com fogo, como deve ser. O silêncio do presidente da República e as declarações do seu vice revelam a expressão do principal negacionismo que mata, há 520 anos, principalmente, pretos e pretas, e indígenas: ou seja, o racismo.
Não foi um evento, foi um momento ímpar em uma marcha de 520 anos da Diáspora Africana para construção da verdadeira liberdade. Os quilombos urbanos de Porto Alegre em luta cotidiana pela construção do bem viver se fizeram presentes e se colocam a disposição da Família de João Alberto para o que for necessário para que a Justiça seja de fato concretizada.
*A foto que ilustra a matéria é de Luiza Castro, do Sul 21