Dica de cinema: A paixão de Ana, de Ingmar Bergman

Nota: quero, antes de tudo, me desculpar com as leitoras e os leitores dessa coluna pela ausência nas últimas semanas. O que passa é que estive sobrecarregado por problemas familiares e mudanças na minha vida. Felizmente tudo está se resolvendo e retorno para esses encontros quinzenais, toda quinta-feira, salvo exceções.

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            A coluna de hoje vai tratar de um filme muito interessante, impactante, daqueles de ficar debatendo e conversando, e o filme permanece na cabeça por uns dias. O longa é do Ingmar Bergman, grande diretor sueco, autor de inúmeras obras-primas da sétima arte como Gritos e sussurros e Persona. Trata-se de A paixão de Ana, que assistimos eu e minha companheira completo e legendado no Youtube.

            Essa obra é de 1969, portanto, se localiza entre filmes de grande expressão do diretor, como O sétimo selo (1957), Persona (1966) e Gritos e sussurros (1972). É um grande filme, que está inserido num processo de desenvolvimento de um dos mais belos exemplos da sétima arte. Bergman, segundo o site IMDB, fez filmes de 1946 a 2008 – é mais de meio século fazendo cinema!

            A paixão de Ana conta no elenco com atrizes e atores sempre reconhecíveis nos filmes do cineasta sueco, principalmente o par protagonista Liv Ullmann e Max Von Sydow, mas também Bibi Andersson e Erland Josephson. Neste longa, diferentemente da maioria (acho que podemos falar maioria, ao menos em se tratando dos dramas a partir de Persona (1966), o protagonista é masculino, aqui Max Von Sydow interpreta Andreas Winkelman, um homem que a princípio sofre pela sua separação, e que está isolado numa casa rural. Liv Ullmann interpreta Ana, que dá título ao filme e que divide, de certa forma, o protagonismo do longa. Ela é uma mulher que, a princípio, perdeu o marido e o filho num acidente de carro, e chora frequentemente com pesadelos essas perdas. A película tem, ainda, o colaborador habitual e grande cinegrafista, o diretor de fotografia Sven Nykvist, dirigindo uma câmera às vezes inquieta, às vezes sossegada, repousando em closes – que Bergman adora – que mostram, na minúcia, as grandes atuações, principalmente dos protagonistas.

            O enredo junta Andreas e Ana, que não se conhecem e passam a conviver e depois a morar juntos. O fato de Andreas chamar-se assim, o mesmo nome do ex-marido de Ana, começa a confundir o espectador, e com o passar do tempo, numa espiral de tensão e violência – que culmina numa tentativa de feminicídio – acompanhamos um enredo com personagens complexos e que instigam a interpretação de quem está vendo. Bergman ainda põem na trama casos estranhos e violentos na comunidade rural, uma série de assassinatos de animais.

            Bergman é daqueles cineastas que vão fundo na complexidade humana, evocando sentimentos muitas vezes recaldados, como o ódio, o remorso, o desejo, a arrogância, a violência. De sutileza em sutileza, o diretor sueco cria mais um grande filme em sua vasta filmografia, afirmando uma vez mais o porquê ser considerado um dos grandes da sétima arte e influenciar tanta gente, de Andrei Tarkovski a Woody Allen, passando por Béla Tarr, Lars Von Trier e tantos outros.

Rodrigo Mendes