Texto de opinião de Ignacio Munhoz
Neste texto falarei de forma breve sobre como alguns governos estão administrando de maneira nefasta e criminosa os diferentes efeitos da pandemia. Em resposta, o povo saiu às ruas exigindo dignidade, pois a pandemia novamente revelou a profunda desigualdade que habita na nossa querida latina américa, onde a saúde ainda é um luxo ou abertamente negligenciada.
O Paraguai, nos primeiros dias de março, viveu uma onda de protestos em diferentes cidades do país (com foco na capital Assunção). Os atos eram contra a ausência de políticas de saúde para enfrentar a pandemia por parte do presidente Mario Abdo Benítez, do “Partido Colorado” (partido abraçado pelo ditador Stroessner). O resultado foi o “quase colapso da rede hospitalar” e um número elevado de pessoas vindo a óbito. Entre os protestos e as respostas do governo à crise, foram demitidos três ministros e, junto com eles, também o ministro de saúde Julio Mazzoleni, que apresentou sua renúncia no dia 5 de março. Até o dia de hoje, o Paraguai continua com uma taxa de vacinação muito baixa (0,2%) e os problemas que o povo reclamava nas ruas ainda persistem.
Agora é a vez do Chile, que apesar de ter uma alta taxa de vacinação (a melhor do continente e umas das cinco melhores do mundo) e de estar vivendo uma aparente calma no âmbito sanitário, sofreu com duas semanas graves de contágios, entre fins de março e começo de abril. Isso foi fruto de uma flexibilização de regras de circulação de pessoas no período de verão (atendendo a interesses da área de turismo), o que trouxe como consequência o colapso da rede hospitalar em Santiago e a vinda da nova variante brasileira do vírus chamada de P1. Os efeitos econômicos da pandemia não tardaram em chegar e trouxeram uma nova bomba política até a casa de governo de Piñera. Ele foi encurralado pelos diferentes partidos de oposição e uma crescente demanda social nas ruas, que exigia a autorização do retiro de dinheiro da aposentadoria (que no caso de Chile é privada e significa um lucrativo negócio desde os anos 90).
Para resumir a história, o país viveu três etapas de retirada massiva de dinheiro durante estes meses. Entre barricadas e ameaças de impeachment contra Piñera e uma possível nova revolta social no país, não restou outra opção para o grande empresariado, a não ser aceitar e ficar quieto. Por consequência das constantes retiradas de dinheiro por parte da maioria do povo, o colapso de todo o sistema de previdência privada está prestes a acontecer (o chamado sistema de AFP é o coração econômico do modelo neoliberal no Chile já faz 30 anos). Isso é para a sorte de todos os chilenos, que vêem com certo grau de otimismo o fim deste sistema idealizado pelo irmão do presidente Piñera, José. O sistema AFP deixa como legado uma aposentadoria miserável, que força milhares de chilenos a trabalhar literalmente até a morte.
Para encerrar a nossa breve viagem pela casa de alguns de nossos vizinhos, temos que mencionar o que está acontecendo na Colômbia. Produto das políticas econômicas de austeridade fiscal no contexto pandêmico, o barril de pólvora explodiu na Colômbia depois da reforma tributária impulsionada pelo presidente Ivan Duque, do partido de direita “Centro Democrático”. A reforma ia elevar o valor da cesta básica, gerar uma alta na conta de luz, além de subir a carga tributária para todo povo pobre colombiano. Seu efeito imediato foi uma onda de protestos em diferentes cidades do país, iniciadas no dia 28 de Abril e vigentes até hoje. Eles têm como foco as cidades de Cali e Bogotá, onde as manifestações foram violentamente reprimidas pela polícia, tendo como resultado até agora 20 falecidos e mais de 800 feridos, segundo os números da “Defensoria do povo”, órgão do Estado colombiano que cuida dos direitos humanos no país.
Depois de muita pressão nas ruas da Colômbia, nesta segunda-feira, 3 de maio, o presidente Duque anunciou a retirada de seu projeto de reforma tributária, como também a renúncia do ministro da fazenda Alberto Carrasquilla. Apesar de tudo isto, o povo colombiano continua nas ruas em estado de mobilização constante, procurando mudanças mais profundas em um país profundamente desigual.
O clima no nosso continente está agitado e em constante erupção social. As políticas para enfrentar os efeitos da pandemia por parte dos diferentes governos castigam, como é de costume, aos mais pobres. O modelo econômico neoliberal, que opera em diferentes níveis no continente faz longos anos, está aos poucos colapsando e o povo, a cada dia, entende que é o protesto popular a única saída para fugir da política da morte que os de arriba nos querem impor como política de governo.
Ignacio Munhoz é imigrante Latinoamericano, pesquisador informal das lutas populares, amante dos chocolates e do Colo Colo. Serigrafista emergencial até novo aviso. Samba e rap fazem parte do seu equilíbrio espiritual. Colunas de opinião quinzenais sobre conjuntura Latinoamericana.