I ELAOPA | Declaração final

ENQUANTO EXISTIR UM SONHADOR, VAI EXISTIR ESPERANÇA…

Neste janeiro de 2003, em Porto Alegre, Brasil, existiu mais de um fórum. O fórum dos que dizem que sabem e dos famosos, o fórum dos turistas, o fórum das ONGs, o fórum dos libertários, ecologistas, organizações de base e muitos outros mais. Não sabemos se todos cumpriram seus propósitos, mas nós, pessoas que lutamos dia a dia nas ruas, fábricas, campo, comunidades indígenas, escolas, periferias, cooperativas, enfim, em todos os lugares onde está se tornando realidade os sonhos de justiça, fraternidade, igualdade, solidariedade, apoio mutuo, democracia direta, nós temos certeza de que avançamos em nossos objetivos.

Catadores de lixo, universitários comprometidos com seu povo, trabalhadores de meios de comunicação independentes, donas-de-casa, trabalhadores em saúde, educação, metalúrgicos, sindicalistas, todos estes organizados nos Comitês da Resistência Popular Gaúcha, Coletivo pela Universidade Popular e Centro de Mídia Independente de Porto Alegre fizeram possível que as experiências e esperanças dos povos de onde somos se encontrassem durante dois dias de debates respeitosos, fraternos e com toda a diversidade multicultural de nossos povos e tradições organizativas.

Através de grupos de discussão e de oficinas de intercâmbio, chegamos às seguintes conclusões:

PRINCÍPIOS
1. Nos definimos como organizações sociais orientadas pela luta de classes e identidade como povos originais deste continente, com princípios de trabalho de base, democracia direta, solidariedade entre os de baixo, luta popular e autonomia dos oprimidos e dos povos originais.
2. Manter a autonomia frente a partidos políticos, Estado e seus governos, ONGs, empresas, e de todos aqueles que vêm nos dizer o que temos que fazer, com estruturas autoritárias e distantes de nossa realidade.
3. Reivindicamos a autonomia porque é uma ferramenta para realizar nossos sonhos.
4. Fazer ações políticas a partir de nossas organizações sociais com a participação de todas e todos para criar um poder nosso, um Poder Popular.
5. Juntar nossas mãos e forças para mudar a realidade de desemprego, fome, doenças e um sem fim de carências, porque devemos ter claro que é somente desse modo que podemos vencer a globalização feita pelos ricos. Por isso, devemos resistir, à nossa maneira, a este mal que é comum a todos nós.
6. Criar resistência, do nosso jeito, através dos valores de nossos povos e tradições culturais.

CONJUNTURA LATINO AMERICANA

Os de cima que hoje se chamam neoliberais causaram e causam as privatizações, a dívida externa, as más condições de trabalho, violência e destruição de valores, costumes, tradições e riquezas naturais: água, florestas, terra, ervas medicinais, animais, sol, ar, etc. Tudo isto já acontece e ficará ainda pior com o Acordo de Livre Comércio das Américas (ALCA).

A ALCA destrói a autonomia dos países, cria um espaço territorial dos ricos do mundo, que fazem da dominação uma lei que não respeita as fronteiras culturais e nem a soberania de nossos povos.

Os governos que estão negociando a ALCA estão negociando na verdade a vida de nossa gente e querem nos convencer que a ALCA é algo que virá para o nosso bem.

O Mercado Comum do Sul, o MERCOSUL, representa o fim das fronteiras somente para as empresas e governos, não representa uma união dos povos. As empresas e o governo do Brasil se impõe sobre os demais povos (Argentina, Paraguai, Uruguai), causando ainda mais miséria.

Os Estados Unidos, com a cumplicidade dos governos de nossos países, está minando de militares os nossos povos, desde o México até a terra do fogo, para impor pela força a sua maneira de viver e nos fazer ficar dependentes deles para tudo. Isto não é passado, é algo que está acontecendo agora com o Plano Puebla Panamá, Plano Colômbia, a base de Alcântara no Brasil, a tríplice fronteira Argentina-Brasil-Paraguai, o plano “Dignidade” da Bolívia, entre outros exemplos.

As consequências da dívida externa em nossos países fazem mais dura a vida da maioria da população, enquanto seguem se beneficiando os de sempre. Não pagar a dívida externa é uma condição para que os povos da Latino América avancem em suas conquistas. Não podemos pagar com nossa miséria por uma dívida que não fomos nós que geramos.

Diante dessa situação que é comum a todos nós, acordamos em nos unir e fazer ações diretas para lutar contra a ALCA.

COORDENAÇÃO CONTRA A ALCA
· Coordenar diversos movimentos sociais e organizações populares para falar, discutir e analisar como nos afeta a ALCA em nossos lugares: fábrica, escola, sindicato, favela, comunidade, bairros, etc;
· Levantar bandeiras em comum e nos apoiarmos mutuamente dentro de nossas possibilidades;
· Impulsionar plebiscito ou consulta popular para que o povo decida se quer ou não a ALCA;
· Usar tudo o que estiver ao nosso alcance, desde nossa cultura e meios, para informar sobre os efeitos e formas de resistência à ALCA, MERCOSUL e demais planos dos de cima;
· Ensaiar formas de economia que sejam contrárias às formas impostas pelos de cima, com base solidária e que gerem a nossa independência em relação a eles.

Como povos e organizações em luta, cremos ser possível a coordenação e articulação política, técnica, de capacitação, econômica, etc, para enfrentar o perigoso inimigo que é a globalização capitalista e sua expressão na América, a ALCA. Porém, devemos combater esse inimigo construindo alternativas práticas e concretas, e não apenas rechaçando-o.

Para isso, coordenaremos atividades de todo o tipo, estabeleceremos uma rede de comunicação com todos os meios disponíveis – correio postal, jornais, visitas, site na internet, etc. Vamos desenvolver a solidariedade entre nós como eixo central neste início, fazendo desde ações em comum simultâneas até ações por apoio às organizações irmãs.

Finalmente, os participantes do primeiro encontro latinoamericano de organizações populares autônomas, os de baixo, os mais pobres, os da cor da terra, camponeses, indígenas, operários, catadores, desempregados e excluídos, resolveram: convocar o 2º Encontro Latino Americano de Organizações Sociais, Indígenas e de Resistência Popular Autônomas, na Bolívia, em janeiro de 2004. Aí vamos aprofundar e avaliar as linhas de ação e luta em cada povo, cada país, cada organização.

Desejamos que este documento seja socializado e seja um elemento de análise que fortaleça a ação de cada uma de nossas organizações. Nos vemos na Bolívia.

Abaixo os de cima, avante os que lutam!

Declaração Final do 1º Encontro Latino Americano de Organizações Populares Autônomas – 25 e 26 de janeiro de 2003, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil.

Assinam:

Brasil
– Comitê de Resistência Popular da Zona Leste, Porto Alegre, RS
– Comitê de Resistência Popular da Restinga, Porto Alegre, RS
– Comitê de Resistência Popular da Santa Isabel, Viamão, RS
– Comitê de Resistência Popular da Vila Pontilhão de Gravataí, RS
– Centro de Mídia Independente de Porto Alegre, RS
– Coletivo pela Universidade Popular de Porto Alegre, RS
– Núcleo de Apoio ao Movimento dos Catadores, Porto Alegre,RS
– Movimento dos Catadores de Material Reciclável, RS
– Setor independente do Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal, Porto Alegre,RS
– Setor independente do Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Porto Alegre, RS
– Setor independente do Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul, RS
– Setor independente do Sindicato dos Trabalhadores em Correios, Porto Alegre,RS
– Movimento de Cultura Popular, Itajaí, Santa Catarina
– Resistência Popular, São Paulo
– Resistência Popular, Rio de Janeiro
– Fórum de Luta pela Moradia da UFF, Rio de Janeiro
– Pré Vestibular Popular Apoio Mútuo, Rio de Janeiro
– Centro de Cultura Popular Unidos do Parque Georgia, Cuiabá, Mato Grosso
– Coletivo pela Universidade Popular de Cuiabá, Mato Grosso
– Sociedade de Luta Popular de Goiânia, Goiás
– Movimento Boca do Lixo, Recife Pernambuco
– Núcleo de Apoio á Reforma Agrária, Belém, Pará

Uruguai
– Rádio Comunitária Germinal, Montevideo
– Ateneo del Cerro, Montevideo
– Ateneo de las Acácias, Montevideo
– Unión de Trabajadores Açucareros de Artigas, Bela Unión

Bolívia
– Red Tinku de Grupos Autônomos
– CMI- Bolívia

Argentina
– Movimiento de Unidad Popular

Chile
– Educación Popular Germinal

México
– Consejo Indígena Popular de Oaxaca Ricardo Flores Magón

Colômbia
– Coletivo Foro Colômbia

África do Sul
– Bikisha Media Collective

Muitas organizações que participaram do encontro não puderam estar presentes no momento da aprovação da Declaração final, por isso não foram incluídas aqui. Outras organizações se inscreveram para participar do Encontro mas pelas mais diversas razões não puderam comparecer. Assim, deixamos em aberto à outras organizações populares que queiram somar-se à esta Declaração.