Empresa de Marília (SP) reduz home office na fase vermelha e descumpre protocolos contra a Covid-19

A empresa Paschoalotto, localizada em Marília, no oeste paulista, exigiu a volta dos funcionários às atividades presenciais, ignorando os riscos em plena fase vermelha.

Contexto

Desde 8 de janeiro, a cidade regrediu no “Plano SP” (a estratégia de São Paulo para combate ao Coronavírus). Semana após semana, o município deixou a fase amarela e atingiu a fase vermelha ainda no fim do mês. No entanto, apesar da marca mais crítica alcançada rapidamente no começo do ano, a empresa de telecomunicação Paschoalotto, uma gigante no ramo, exige de seus trabalhadores o retorno para as atividade presenciais sem justificativa, colocando em risco de contágios pessoas que trabalhavam de home office, muitas delas do grupo de risco.

A empresa, no início da pandemia, anunciou a compra de insumos para seguir um protocolo de segurança, bem como transferiu diversos trabalhadores para o modelo de trabalho remoto. A empresa anuncia a compra de 3 mil litros de álcool em gel, e outros recursos como máscaras que seriam distribuídos pela empresa. Neste mesmo período, o Governo Federal de Bolsonaro (sem partido) elencava os serviços de teleatendimento como essenciais, permitindo seu funcionamento mediante comprimento de protocolos de saúde e sanitização.

Ponto por ponto

A Associação Brasileira de Teleserviços (ABT) anunciaram em abril de 2020 um manual de saúde que estabelecia medidas a serem seguidas para prevenção de contágios. A entidade contava com cerca de 40 unidades e empresas e este manual foi submetido ao Ministério da Saúde, que aprovou o documento com poucas alterações.

Outro documento com indicações de medidas importantes a serem tomadas para a proteção de trabalhadores do tele-serviços foi feito pela Casa Civil em julho de 2020. Trata-se de um protocolo complementar e específico para escritórios de call center, teleatendimento e afins.

A própria Paschoalotto publicou em seu site algumas medidas que pretendia seguir. No entanto, a Paschoalotto não segue rigorosamente todos os itens desses protocolos, apesar de já ter feito grandes reorganizações dos espaços comuns e individuais dos horários de funcionamento, refeições e intervalos de descanso.

A limpeza dos Pontos de Atendimento (P.A.s) é realizada a cada troca de turno pelos próprios trabalhadores, que ficam responsáveis de higienizar os microfones, computadores, teclados, cadeiras, mesas, mouses e outros itens da empresa que serão usados pelo trabalhado.

A limpeza das duas unidades é feita por uma empresa terceirizada. Apesar de a limpeza ser bem feita todos os dias, não se nota uma preocupação maior com as superfícies de contato, como é indicado nos protocolos. Superfícies como maçanetas, interruptores, corrimãos, elevadores, botões e etc requerem uma atenção especial.

Os protocolos também indicam que a disposição dos P.A. devem ser parecidos com um tabuleiro de xadrez, intercalando os trabalhadores com espaços vazios de pelo menos 1,5 metros. Na Paschoalotto, isso não é seguido a risca, pois os funcionários estão intercalados apenas em linha, enquanto em coluna permanecem em sequência. A distância entre eles também não chega a 1,5 metro e, por vezes, ficam menos de 1m de distância.

Ainda em relação ao espaço de trabalho, as salas costumam comportar cerca de 200 pessoas. No geral, as janelas e portas ficam abertas para circulação de ar, porém não são em quantidade suficiente para uma boa circulação. Por vezes, algumas salas optam pelo fechamento das janelas e o uso do ar-condicionado, que segundo o documento da Casa Civil, deve ser limpo quinzenalmente, se sua estrutura não for central.

Nestes espaços, também não se nota lixos específicos para materiais com maior possibilidade de contágio. Diferente do lixo comum, é indicado que haja cestos de lixo específicos para o descarte de materiais de alta taxa de transmissibilidade do vírus, como máscaras usadas e danificadas, copos plásticos, EPI’s e etc.

Aglomerações

Já em termos de intervalos de funcionamento, a empresa seguiu as medidas de intercalar o descanso de seus trabalhadores para evitar aglomerações, no entanto, não são eficientes o suficiente como, por exemplo, a saída do prédio de cada funcionário deve ser feita em cerca de 5 minutos, o que não é suficiente nem para encerrar o computador e higienizar minimamente seu local. Além disso, ao fim do primeiro de uma “carteira” (como são chamadas as diferentes sessões) já se inicia imediatamente o segundo turno, de maneira que o atraso de alguns minutos do funcionário do primeiro turno resulta no igual atraso do seu colega de P.A. Assim, na troca de turnos, é comum que haja alguma aglomeração pelo prédio.

Trabalhadores comem e descansam em frente a empresa durante intervalo intercalado.

No dia 19 de janeiro de 2021, o jornal Marília Notícias recebeu uma imagem que supostamente foi registrada no mesmo dia que mostra uma grande aglomeração de trabalhadores em uma das entradas principais da empresa.

Foto publicada no Jornal Marília Notícias.

Ainda em relação à aglomerações, afim de evitá-las, a empresa reduziu seus espaços de refeitório e retirou acentos nas dependências das unidades. Diante disso, os trabalhadores se vem na necessidade de realizarem suas refeições na rua, na calçada em frente a empresa, que resulta em aglomerações da mesma forma, ainda que fora do prédio.

Trabalhadora da Paschoalotto com marmita na calçada da empresa ao meio dia e meio.

Além disso, o grande porte da empresa é capaz de absorver um enorme contingente de pessoas que moram em todas as regiões de Marília. Portanto, diariamente, pessoas de toda a cidade se juntam em um único lugar e compartilham o mesmo espaço fechado por horas. Ao fim do expediente, muitos ainda se servem do transporte público, pegando conduções lotadas em horário de pico.

Trabalhadores contra a parede

De maneira ainda mais grave, a empresa indica em caso de sintomas de Covid-19, os funcionários devem comunicar a empresa para serem afastados durante o período necessário para realização de testes oficiais, apresentação de laudo médico e recuperação. No entanto, nestes casos, a empresa retira o vale-alimentação, alegando que ordinariamente já realizava esse procedimento. Esse desconto substancial na renda de uma pessoa pode inibi-la de utilizar esse direito ao afastamento, pois o salário que corresponde ao serviço de meio expediente, por vezes é a renda de uma família.

Por fim, todos os documentos apontam para a promoção do trabalho remoto e do home office sempre que possível. No entanto, neste início de ano, a Paschoalotto comunica trabalhadores que estavam neste regime de trabalho a voltarem ao seus postos presenciais, mesmo no contexto da fase vermelha do Plano SP.

No início da pandemia, após haver por parte dos funcionários algumas denúncias contra a Paschoalotto alegando o descaso com a segurança do pessoal, a empresa avança em anunciar a compra de insumos para a proteção das pessoas e outras medidas para a comunidade. Em seguida, pouco tempo depois, anunciou uma onda de demissões em massa. Esse episódio registrado no histórico recente da empresa pode inibir funcionários de novas denúncias.

Enquanto isso…

A Paschoalotto conta com unidades em Bauru (sede), Marília e Agudos. Ao todo, emprega mais de 10 mil trabalhadores, de 18 a 70 anos de idade, e tem havido diversas denúncias no Ministério Público a respeito do não comprimento de protocolos mínimos de sanitização para a prevenção do contágio de Covid-19.

Em Marília, a empresa anuncia no final de 2020 uma expansão que irá gerar cerca de 4 mil novos postos de trabalho que teriam origem na abertura de uma nova unidade na cidade. Segundo a empresa, esses postos serão preenchidos ao longo dos 18 meses subsequentes a instalação da nova unidade. A Paschoalotto mesmo em contexto de crise econômica e pandemia conseguiu investir pouco mais de R$5 milhões em um leilão realizado pela prefeitura. A Prefeitura de Alonso (PSDB) anuncia feliz a venda do patrimônio público realizada para empresa e diz ter sido uma árdua competição entre municípios vizinhos que também queriam a instalação da empresa. O diferencial de Marília, aparentemente, foi este leilão em que acordou-se em um pagamento de R$ 2,7 milhões à vista e outras24 parcelas de R$ 114,7 mil.