Estudantes secundaristas de Marília (SP) opinam a respeito do retorno das aulas presenciais

A entrevista foi realizada pela Resistência Popular Estudantil — Núcleo de Marília de modo remoto, respeitando os protocolos de distanciamento social com 5 estudantes do Ensino Médio de quatro escolas públicas de Marília. Nesse encotro virtual, os estudantes tiveram a oportunidade de dar suas opiniões sobre a retomada das atividades presenciais nas escolas da rede pública do Estado de São Paulo.

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A entrevista iniciou com o questionamento a respeito de quais seriam as opiniões dos estudantes em relação a reabertura das escolas já em Setembro deste ano, no Estado de São Paulo.

Danilo Garcia (16 anos), estudante da ETEC de Marília, respondeu que “não seria uma boa opção no momento em que estamos, pois Marília está oscilando entre as faixas vermelhas e laranja [no plano de retomada de SP]”. Isabela Mota (15 anos), também da ETEC de Marília, avalia que os protocolos de segurança elaborados para o retorno são insuficientes, pois “o contato seria inevitável”, afinal de contas, “tem a hora da entrada, da saída e do recreio”.

Já o estudante Teixeira (16 anos), de mesmo vulgo, da E.E. Prof. Baltazar de Godoy Moreira, relata que “vai ser um risco bem maior pra gente, principalmente de manhã para pegar o busão que sempre está lotado”. Ele também pensa na situação de funcionários da escola e comenta que “o trampo das tias da escola vai aumentar muito, porque terão que higienizar a escola todo dia e de maneira muito rápida”. Ele imagina, ainda, que “as salas deverão ser higienizadas entre os turnos, porque os estudantes vão sair, vão se tocar e voltarão para as sala, podendo trazer o corona para sala de aula”. Isac Cavalcante Ferreira (16 anos), da E.E. Oracina Correa de Moraes Rodine, diz que “as escolas não tem nem estrutura para aguentar [a exigência dos protocolos]. As salas, [elas] não tem nem ventilador”. Teixeira comenta ao fundo: “é tipo levar um boi para o abatedouro”.

Alan Alves (16 anos), estudante da E.E Amilcare Mattei, diz que “a galera [do governo] acha que vai higienizar e não vai ter contato no bagulho [entre estudantes], mas pensar isso é pensar em fantasia”. Teixeira finaliza afirmando que “estudo a gente recupera, a vida não”.

Em seguida, foram apresentados aos estudantes os protocolos aplicados nas escolas em Manaus em seu processo de retomada das aulas em Agosto que, segundo o governador Wilson Miranda Lima (PSC), foram baseados no princípio de distanciamento social, prevendo a higienização de ambientes, medição de temperatura, uso obrigatório de máscaras e disponibilização de álcool em gel. Depois, foi questionado se os estudantes consideram esses protocolos suficientes para evitar um contágio massivo e a respeito do que pensam sobre eles.

Danilo imediatamente responde que “não [é suficiente], totalmente não! Porque máscaras e essas coisas não vão prevenir 100%”. Isabela concorda e diz que soube de outros países que tentaram retomar sem contágio massivo e falharam. Acrescenta que “demora para você começar a sentir os sintomas do Covid-19, então, você pode chegar lá com e passar pras pessoas”. Teixeira pontua, certeiramente, que “uma medida segura para voltar às aulas é a vacina”, não tendo, assim, outra opção. Isac concorda com os colegas e acrescenta, em tom de brincadeira, que “é pedir para matar os vovôs” e ironiza dizendo que “precisava arrumar a previdência social, mas eles [o governo] não tinha alguma coisa mais bacana não?”. A turma toda riu.

Mais um questionamento foi feito aos estudantes. Dessa vez, sobre a proposta feita por representantes de empresas, como a Organização Social (O.S.) Amigos da Educação, que está tendo forte adesão de governadores de diversos Estados. São propostas que visam aumentar a jornada de estudo a partir do próximo ano, bem como acrescentar mais um ano no Ensino Médio — uma espécie de 4° ano que seria facultativo seu cursar visando operar como um reforço.

Danilo acha que “se for [uma proposta] opcional é boa, porque muitas pessoas precisam ingressar no mercado de trabalho quando terminam o 3° [ano do Ensino médio]. Precisam acabar a escola rápido, por assim dizer. E tem muitas pessoas que não, que querem estudar mesmo, que querem prestar o vestibular, então se [esse 4° ano] vier como um reforço seria bem melhor”. Isabela afirma não ter uma posição fechada sobre a pergunta e prefere não se colocar. Teixeira concorda com Danilo, mas surgem dúvidas em relação ao diploma, se o estudante obterá o mesmo ao fim do 3° ou ao fim do 4°. Isac comenta outras alternativas para o ano que vem, como um supletivo entre os anos, ou ainda “um provão com o conteúdo do ano passado”. A proposta foi polêmica e gerou um debate no grupo. Retrucaram sobre a dificuldade disso ser possível. As vozes na chamada começaram a se atravessar e cortar. A discussão é retomada com Isac afirmando que “o problema é que não tem como fugir da evasão escolar”.

Essa afirmação deixa o grupo todo em certo silêncio, possivelmente por estarem refletindo sobre. De fato, a evasão escolar já é uma constante na educação brasileira. No contexto de pandemia, ela deve se intensificar. Ainda, considerando o Ensino Remoto nas escolas e o cenário de abandono do povo pelo Estado, é possível imaginar o quão grande será essa evasão.

Por fim, aproveitando o pequeno hiato na discussão, a última questão é lançada indagando se algum deles já pensou em alguma proposta sobre esses problemas para fazer às diretorias de seus colégios, aos seus professores e aos governantes.

Danilo responde que “pensar em retornar para as escolas presencialmente, só com a vacina”. Teixeira diz que é preciso cancelar o ano e retomar as atividades letivas somente quando a pandemia estiver acabada., apontando que apesar de poder haver uma não aceitação por parte dos terceiros anos em relação a isso, é o necessário, “não dá para fazer todo mundo feliz”, conclui. Isabela pondera que as propostas apresentadas têm prós e contras e que, de fato, não tem muito como deixar todo mundo feliz. Ela afirma que o “governo nunca escutaria uma proposta dos estudantes que não levasse em consideração o mercado de trabalho”, pois esse parece ser o interesse deles. Isac diz que prefere esperar para ver o que acontece, mas não está muito otimista. Teixera comenta que “também não dá para esperar coisa boa do governo, né?” e Isac segue na piada: “não sei, não sei. Sou brasileiro, né, cara? Eu não desisto nunca”. É possível escutar as risadas da Isabela, também. Alan toma a palavra dizendo que “qualquer coisa nóis sai na rua e protesta… joga pedra na prefeitura, sei lá”. Todos riem.

Com essa última resposta, a revista foi encerrada com as considerações finais. Danilo pede para divulgar sua página no Facebook chamada Bolachacity que busca promover, de maneira independente, artistas da cidade de Marília. Teixeira, um pouco sombrio, comenta que este ano está perdido para Educação. Pegando um gancho em sua fala, Isabela afirma que, por isso, o cancelamento do ano letivo é de suma importância. Todos se despedem e desligam a videochamada.