A retomada das atividades presenciais nas escolas estaduais em SP durante a Pandemia

Governos dos Estados estipulam reabertura das escolas em setembro. A quem serve a retomada das aulas presenciais das escolas em meio a pandemia que já ceifou mais de 800 mil vidas no mundo todo?

Por Resistência Popular Estudantil – Núcleo de Marília

Situação de retomada das aulas presenciais em outros países

O retorno das aulas presenciais na rede pública e privada é um dos temas mais debatidos, atualmente e, tudo indica, que esse debate continuará na ordem do dia por mais um bom tempo em nosso país, haja vista as variadas experiências práticas de retorno que houve por todo o mundo e seu previsível fracasso no que diz respeito à prevenção de contaminação de estudantes, professores e servidores, no geral. Em diversos países as aulas presenciais estão programadas para retornar, sendo que, em cada um, esse processo tem sido pensado de maneira específica de acordo com o impacto que a crise sanitária do novo coronavírus tem gerado.

Nos países europeus, a expectativa é de que a retomada das aulas presenciais ocorra ainda em Setembro, almejando, assim, encerrar o ano letivo com direito a período de férias. Na Itália, um dos países que foi expoente de má gestão estatal no combate à pandemia por ter adotado uma postura de austeridade, o retorno das aulas está previsto para o dia 14 de setembro.

Diferentemente dela, a Coreia do Sul apresentou uma resposta à pandemia muito eficiente no que diz respeito à contenção de contágios, evitando, dessa forma, o colapso de seu sistema de saúde e a morte de seu povo. Diante deste cenário, o governo coreano ensaiou um retorno às atividades letivas presenciais que foram adiadas por dois meses a fim de evitar novos surtos de contágio, haja vista que houve contaminações nesse processo e, desde o final de maio, conta com cerca de 200 escolas fechadas por conta de surtos de contágio, principalmente em sua capital, Seul.

Já nos Estados Unidos, as posições acerca desse tema está acompanhado da polarização política proveniente da disputa eleitoral pela presidência do país. Estudos mostram que nos Estados em que Trump tem maioria nos colégios eleitorais, a tendência é a de que a população dessas localidades sejam favoráveis à retomada das atividades presenciais. Já nos Estados em que Biden lidera nas pesquisas, a manutenção do fechamento das escolas é preferido pela população.

Situação da retomada das aulas presenciais no Brasil

No Brasil, a pandemia se alastra, cada vez mais, de modo que somamos mais de 4 milhões de infectados e mais de 126 mil mortos. Em meio a esse cenário catastrófico, pudemos, infelizmente, partilhar dos efeitos desastrosos relacionados ao processo de reabertura das escolas com os demais países que ousaram colocar em risco a vida de seu povo nesse processo. Em Manaus, vigora desde 10 de Agosto uma medida que prevê a retomada das aulas presenciais. Após vinte dias de aulas, a Fundação de Vigilância de Saúde verificou 343 professores infectados pelo Covid-19. O Governador do Estado do Amazonas, Wilson Miranda Lima (PSC), quando confrontado com estes números se manteve insistente em relação a decisão de abertura das escolas. É preciso salientar que Wilson Lima é um forte aliado de Jair Bolsonaro (Sem Partido) e que, atualmente, é acusado de improbidade por ter comprado respiradores de uma loja de vinhos pelo valor de quase R$3 milhões.

Essa narrativa catastrófica ameaça repetir-se no Estado de São Paulo. O governador do Estado João Dória (PSDB) estipula o retorno das aulas para o dia 20 de setembro. Nesse processo, Organizações Sociais ou Organizações Civis com Interesses Públicos (OCIP) — como a “Amigos da Educação” — se pronunciaram ditando algumas medidas que podem ser adotadas para educação do Estado nesse processo de retomada da presencialidade. Para evitar os contágios ditam protocolos de segurança baseados em distanciamento social, higienização dos ambientes, medição de temperatura, uso obrigatório de máscaras e disponibilização de álcool em gel.

Bruno Covas (PSDB), prefeito de São Paulo,se posicionou contrário a reabertura das escolas no município. Na última semana de Agosto, foram realizados exames sorológicos que constataram que 16% do alunato da rede municipal já foi infectado pelo novo coronavírus e que 66% deles não apresentaram sintomas. É importante salientar que 25% desses estudantes vivem com pessoas acima de 60 anos, classificadas como grupo de risco. Para além disso, um estudo publicado pela UNICEF aponta que menos de 40% das escolas têm acesso a saneamento básico. A respeito das demais, cerca de 61% não possui acesso à água potável,sendo que cerca de 5% das escolas públicas municipais e 5% das estaduais não têm sequer banheiro. Com isso, é preciso questionar a quem serve, de fato, o retorno das aulas presenciais. Meses atrás, o presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado de São Paulo (SIEE-SP) já demonstrava o interesse daqueles que lucram com a educação ao dizer que as escolas particulares já estariam preparadas para o retorno das aulas presenciais alegando, assim, que o retorno das aulas somente em Setembro seria pura incompetência. 

Para além dos protocolos de segurança que em nada condizem com a realidade das escolas públicas, é cogitado a oferta de um 4° ano facultativo que deve operar como uma espécie de reforço preparatório para o vestibular, culminando, assim, no aumento da jornada de estudos. Essa proposta, tal como as que estruturam o retorno a presencialidade, emergem do empresariado brasileiro que manda e desmanda nos governadores do Estado. A criação de um ano “reforço” parte de dois pressupostos falsos. O primeiro é o de que as matérias ofertadas, atualmente, de modo remoto, estão sendo apreendidas pelos estudantes, necessitando apenas de um mero reforço à base de rememoração de conteúdo para que se supere o déficit educacional gerado por esse período. Isto não leva em conta as baixas taxas de adesão das aulas remotas, sendo, assim, uma  justificativa que em nada condiz com a realidade da estudantada brasileira, sobretudo, do setor público. O segundo pressuposto diz respeito a facultabilidade deste 4° ano. Como é sabido, muitos estudantes necessitam, o quanto antes, ingressar no mercado de trabalho, de modo que esse ano a mais não será, de fato, uma opção considerada mediante suas realidades de crescente pauperização. Dessa forma, a desigualdade de ensino será ainda maior, principalmente quando avaliamos que escolas privadas podem garantir essa estrutura de mais um ano sendo, inclusive, algo de seu interesse na medida em que é uma determinação que aumentará ainda mais seu lucro diante a possibilidade dos seus estudantes “clientes” poderem pagar por mais esse ano “preparatório”.

A proposta de um 4° ano facultativo e preparatório ao vestibular é interessante para as grandes empresas da educação que já possuem estrutura e experiência com o negócio de cursos pré-vestibular, como Objetivo, Anglo, Etapa e outros nomes que compõe o oligopólio da educação no Brasil

Dessa forma, o retorno a presencialidade só visa encher o bolso de poucos que lucrarão às custas da morte de muitos.

Professores e estudantes apresentam uma alternativa popular a cerca da abertura das escolas para o retorno das atividades letivas de maneira presencial: esperar o desenvolvimento de vacinas.