“Ser freireano não é repetir os textos de Paulo Freire.” – Entrevista com Oscar Jara

Por Luís Gustavo Ruwer, estudante de Ciências Sociais e militante extensionista

Foto destacada: Entrepbs/Herriarte

Vídeo da entrevista na íntegra no final da reportagem 

Entre os dias 28 e 31 de agosto, a UFRGS recebeu a 36ª edição do Seminário de Extensão Universitária da Região Sul (SEURS). Com o tema “Extensão: ação transformadora”, o SEURS 36 recebeu cerca de 1200 extensionistas, provocando a reflexão sobre capacidade da extensão universitária de agir, entender e contribuir para modificar a realidade em que se insere. À convite da Pró-Reitoria de Extensão (PROREXT), o seminário recebeu o educador popular e sociólogo Oscar Jara. Com seu jeitinho “freireano” de ser, Jara arriscou um portunhol e conversou com o Repórter Popular.

“Ser freireano não é repetir os textos de Paulo Freire, mas fazer coisas com um jeitinho nordestino freireano.”

Oscar Jara nasceu no Peru, e quando jovem, iniciou sua militância no movimento estudantil. Inspirado no método de alfabetização de Paulo Freire, começou um trabalho de educação popular em um bairro onde atuava. Desde lá, seguiu sua trajetória como educador popular trabalhando em conjunto com movimentos comunitários, sindicais e camponeses de diversos países da América Latina. Hoje, Oscar Jara trabalha na Costa Rica em um centro que coordena vários projetos de educação popular, economia solidária e extensão universitária. Além disso, é presidente do Consejo de Educación Popular de America Latina y El Caribe (CEAAL).

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Foto: Vitória Freitas

Desde a abertura oficial do SEURS, Oscar Jara foi uma figura instigadora. A a comunidade extensionista acompanhou sua fala sobre os desafios éticos, políticos e pedagógicos que a extensão universitária enfrenta na atual conjuntura latino-americana. Jara ainda citou versos da “Canção Óbvia”, de Paulo Freire e finalizou a palestra com a canção “Tengo América em mi voz”, de Carlos Mejía Godoy, acompanhado por um coro de centenas de extensionistas que lotaram o Salão de Atos da UFRGS. Durante a semana, Jara foi facilitador do minicurso “Sistematização de experiências de extensão universitária: práticas e desafios”, um de seus temas de estudo. O educador popular reafirma a importância da sistematização, com o objetivo de de gerar uma reflexão crítica, a aprendizagem e a divulgação da ação extensionista.

“Todo sistema educativo, toda instituição, toda entidade é um campo de disputa verdadeiramente, então não tem entidades que são puras, neutras, mas tem um espaço de disputa entre os setores e interesses de classe da sociedade.”

O sociólogo questiona o modelo de extensão universitária vem sendo produzida, e defende uma extensão como ação social transformadora. Uma extensão crítica, aliada ao ensino e pesquisa, na perspectiva da educação popular. Uma extensão popular, que em conjunto com os movimentos sociais construa novas relações entre os sujeitos, as comunidades, a universidade, processos que sirvam como base para uma nova sociedade.

“A extensão universitária entendida como extensão popular ou como ação social transformadora é um processo em que as universidades se engajam com a dinâmica dos setores e movimentos em função de um projeto de sociedade.” 

O sociólogo faz uma avaliação sobre a ascensão e queda dos governos de esquerda na América Latina e os desafios para os movimentos sociais a partir de agora.

“Uma revolução é muito mais que uma mudança de governo. É um processo que deve estar dentro das capacidades, dos corações, das mentes, das utopias que cotidianamente tem que se criar. E portanto, um processo muito mais complexo que aquele que talvez pensávamos em algum momento, que vamos mudar a sociedade se temos acesso à conquista do governo, e desde o governo vamos mudar tudo. É um processo cultural, político, social, que tem a ver com muitos fatores.”

A conversa com Jara renova nossa concepção de esperança. Não no sentido da “pura espera”, ou da “espera vã”. Esperança com jeitinho freireano, como o esperar do “jardineiro que prepara o jardim para a para a rosa que se abrirá na primavera”.

“Esses sonhos, essas utopias que orientam nossas perspectivas de transformação, não devem ser como algo que alguém vai criar e um dia vamos chegar, mas que essa utopia temos que fazer a cada dia em nossa atuação. Devemos ser coerentes, procurar ser coerentes, com esses valores para construir a cada dia novas possibilidades para o futuro.”

Entrevista com Oscar Jara

Posted by Repórter Popular on Sunday, September 2, 2018

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