O LEVANTE É PELA TERRA! – Nosso direito é originário e não começa em 1988

Por Ane Xukuru do Ororubá

O movimento indígena brasileiro vem passando pelo seu pior momento desde a sua projeção a nível nacional na década de 70. Estamos vivendo sob ataque incessante do Estado e suas instituições, que se constituíram no país que chamam Brasil, como uma verdadeira máquina de matar indígena. Nesse momento, eles tentam a todo custo, passar por cima de direitos duramente conquistados pelos mais velhos que derramaram sangue na luta pelos nossos territórios. A Constituição Federal de 88, tem, entre seus artigos, os artigos 231 e 232 que garantem o direito ORIGINÁRIO de nossas comunidades sobre as terras e nos concede, autonomia para nos organizar a partir da nossas línguas, cosmologias, tradição e cultura, em uma tentativa de reparação secular pela violência empreendida pelo Estado colonial, que nos via, até 1988, como sujeitos incapazes, que precisavam de tutela.

Fundamentados pela tese do marco temporal, o agronegócio com apoio da bancada da bíblia e da bala, base expressiva do governo Bolsonaro, tenta rever direitos já conquistados, como é o caso das demarcações de terra, sabotando a autonomia cultural-religiosa e de organização dos povos originários e tentando destituir, inclusive, o direito à autodeclaração, colocando sob a responsabilidade dos órgãos indigenistas a autoridade para decidir quem é indígena ou não. Mais do que inconstitucional, esses são ataques diretos aos nossos povos, territórios e modos de organização.

Enquanto avançam os projetos de lei atualmente em trâmite na Câmara dos Deputados e no Supremo Tribunal Federal, o agronegócio articula seus golpes, tentando por meio de uma Ação Cível Originária (ACO) 1100, que trata sobre a disputa de terra entre os povos Xokleng, Kaingang e Guarani e o Governo do estado e Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina, rever a demarcação da Terra Indígena Ibirama Laklaño, matéria apresentada como recurso extraordinário que tem repercussão geral. Com base no marco temporal, a argumentação da ACO põe em cheque o nosso direito originários às terras ancestralmente ocupadas, de modo que afeta 60% das terras indígenas JÁ demarcadas no país, anulando também qualquer possibilidade de novas demarcações.

Além desse instrumento legal, o agronegócio também apresenta a PL 490, que entre outras coisas, libera as terras indígenas para os invasores, grileiros, mineradoras, garimpeiros e toda a sorte de gente que mata indígena e destrói a natureza, vide episódios como Brumadinho e Mariana, lhes dando direito de explorar terras indígenas sem a consulta prévia e o consentimento dos povos, entrando em colisão com as organizações sócio políticas dos mais de 305 povos indígenas no Brasil, que rejeitam esse projeto de lei. Na agenda anti indígena, o agronegócio também se articula para retirar o Brasil da condição de signatário da convenção 169 da OIT, documento de fundamental importância que protege além dos povos originários também os povos tradicionais e nossas terras, costumes e tradições.

O cenário seria desesperador, se nós não tivéssemos a organicidade que temos e se nós não fôssemos, no Brasil do século XXI, o movimento que mais organizou luta nesse país, com uma mobilização massiva e com a força do exército encantado que nos protege e guia. Estão hoje no Distrito Federal mais de 700 indígenas com representações de mais de 25 povos, lutando em meio a uma pandemia, no frio, na chuva, para que nossos direitos sejam mantidos. Mas é preciso mais, muito mais e por isso, os escrevo.

A nossa luta não é nossa apenas. Essa luta é de todos aqueles e aquelas que vivem nesse lugar que chamam de planeta Terra, porque é a luta pela vida e sobrevivência da espécie humana, dos espíritos, da fauna, da flora. Não se trata aqui de disputas de cunho meramente político e ideológico, é muito além, é pela vida, pelo direito de viver com dignidade, autonomia. E essa luta deve ser encampada por todas e todos. E o chamado está sendo feito, indígenas e não indígenas, é preciso mover-se, é preciso rebelar-se, é preciso lutar. É preciso aliançar-se com os povos, aliançar-se com a terra e os territórios, culturas, línguas e cores. É preciso, com urgência, defender a vida.

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Para doações no local: Praça da Cidadania, SCTN, Brasília, DF.

Para mais informações:

Projeto em pauta na Câmara na prática acaba com demarcações de terras indígenas

STF inclui na pauta ação sobre TI Ibirama Laklaño que influencia Recurso Extraordinário com repercussão às demais terras do país

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