“O povo foi obrigado a se unir porque a prefeitura é omissa.”

Torcidas organizadas do Inter dão exemplo de solidariedade

Reportagem e fotos por Gustavo Ruwer/Repórter Popular

Nesta sexta-feira (5 de julho), tivemos a noite mais fria do ano em Porto Alegre, segundo meteorologistas a mínima chegou a 3ºC com sensação térmica de -2ºC. Uma ação solidária organizada pela Diretoria de Inclusão Social do Sport Club Internacional, abriu o Gigantinho, ginásio do colorado, para receber pessoas em situação de rua. Como protagonistas da ação, se destacam as tradicionais torcidas organizadas do Inter, como a Guarda Popular, Camisa 12, Nação Independente e Força Feminina Colorada.

A estrutura do evento esteve disponível para 300 pessoas em situação de rua, praticamente dobrando as vagas hoje oferecidas em Porto Alegre, que totalizam 355. Cerca de 50 mil peças de roupas, 7 toneladas de alimentos, 2 mil cobertores e 3 mil litros de água foram arrecadados. Além disso, trabalhadores da Fundação de Assistência Social e Cidadania (FASC) ofereceram vacinas contra a gripe, testes rápidos de HIV, Sífilis, hepatites e tuberculose.

Muitas vezes criminalizadas pelos grandes veículos de mídia, as torcidas organizadas e barras do Inter tem um histórico de ações sociais desenvolvidas em comunidades de Porto Alegre e região metropolitana, asilos, hospitais e ocupações urbanas. Em entrevista para o Repórter Popular, integrantes das torcidas relatam algumas ações organizadas anteriormente e defendem que se é possível juntar pessoas para torcer, também se pode juntar para fazer ações solidárias.

Camisa 12

“A gente faz esses movimentos seguido, só que não é divulgado, né? A gente faz  e não aparece. A torcida organizada é marginalizada, aparece sempre o lado negativo, o positivo nunca. (…) Então o que a gente tá fazendo aqui, hoje, é só um pouco do que a Camisa 12 vem fazendo ao longo dos anos. Não só a 12 como as outras organizadas, como a Nação e a Popular que está aí também.” – Mari, integrante da Camisa 12

Nação Independente Colorada

“No natal do ano passado a gente atendeu em média 800 crianças da Vila Mato Grande, em Canoas, com brinquedo, bala, animação, cachorro quente… A torcida sempre tá engajada nesse tipo de coisa.” – Leonardo “Bochecha”,  vice-presidente da Nação Independente Colorada

Guarda Popular do Inter

“A gente já estava fazendo a campanha do agasalho,e  como teve esse evento hoje, a gente trouxe todas as roupas pra cá. É maravilhoso ajudar a quem precisa, a gente tá desde as 9 horas ajudando e separando roupas. Essa semana, a gente provavelmente vai nas Ilhas levar roupas, comida, rancho, tudo que a gente já tá separando pra ajudar realmente quem precisa nesse momento, nesse frio aí.” –Wagner, integrante da Guarda Popular do Inter

Força Feminina Colorada

“A gente já tem um trabalho com mulheres vítimas de violência doméstica na Ocupação Mirabal, a gente tem a banda também, que é um projeto social que tem há 3 anos, que chama a gurizada das periferias pra aprender a tocar um instrumento musical, pra socializar, pra conhecer outros capitais, ter contato com outras coisas que eles não tem na região deles. A gente consegue ingresso, leva eles pra parques, faz várias coisas fora do dia a dia deles. Como o futebol tá muito elitizado e o preço dos ingressos cada vez mais caros, é uma forma da Força Feminina Colorada de trazer essas pessoas pra dentro do estádio, que não teriam condições.”  – Janaina,  vice-presidente da Força Feminina Colorada

A prática é reconhecida pela própria população de rua

É o que afirma Deivid, gremista e morador de rua do centro de Porto Alegre (entrevista na íntegra no fim da reportagem):

“Eu fico na Praça XV e uma das torcidas organizadas do Inter, se não me engano a Camisa 12 ou a Super Fico levou comida pra nós.” Deivid, em situação de rua

O oportunismo da Prefeitura de Porto Alegre

Em nota, o Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) critica a parceria da Prefeitura de Porto Alegre com o Inter e afirma que o prefeito Nelson Marchezan Jr. está acabando com a política de assistência social da cidade fechando o único restaurante popular, despejando um abrigo Municipal e expulsando pessoas em situação de rua de alguns locais da cidade.

Adesivo da Frente Inter Antifascista

Os torcedores do Inter concordam com a crítica apontada pelo MNPR, o texto da Frente Inter Antifascista publicado na coluna “Mais que um jogo” na sexta-feira (5) denuncia o sucateamento das políticas públicas de assistência social e questiona:  “Após serem abrigados no Ginásio Gigantinho nesse final de semana, para onde essas pessoas irão?”. Para os colorados, a ação solidária é uma resposta a omissão da prefeitura, que teria inclusive teria tentado se autopromover em cima da ação. 

“Por isso que hoje tá isso aqui, né? O povo foi obrigado a se unir em prol dessas pessoas porque a prefeitura é omissa.”  – Mari, integrante da Camisa 12

“Eles tiveram aqui mas (…) a mão de obra total, foi quase das torcidas em relação a separação de roupas, os Cozinheiros do Bem junto com as [torcidas] organizadas.” Wagner, integrante da Guarda Popular do Inter

“Exatamente o que a prefeitura fez eu acho que eu não sei te dizer de fato (…). A parte social da prefeitura tá deixando bastante a desejar. Tendo consciência e vendo o que está acontecendo, a população se junta nos seus grupos e faz o que o poder público não está fazendo.” – Janaina,  vice-presidente da Força Feminina Colorada

“É uma ação fundamental por parte do clube e das torcidas, mas um pouco de oportunismo por parte da prefeitura, que vem compondo uma série de desmanches no aparato que dá um suporte pra essas pessoas que vivem em situação de rua. Um elemento que prova isso é a demanda que teve aqui hoje.” – Integrante da Frente Inter Antifascista que preferiu não se identificar

“Essa iniciativa do Internacional está sendo feita em conjunto com a prefeitura mas a prefeitura não disponibilizou um ônibus  pra nos trazer pra cá, quem nos trouxe pra cá foram duas pessoas que eu nunca vi na rua, a prefeitura tá cagando e andando, velho (…) é querer pagar de bonzinho, querem levar o crédito por uma coisa que é obrigação deles.”Deivid, em situação de rua

Sucateamento das políticas públicas de assistência social

Os torcedores entrevistados acreditam que houve um crescimento da população em situação de rua em Porto Alegre em contraposição a isso, o sucateamento das políticas públicas. Eles criticam medidas como o fechamento de albergues, restaurantes populares e perseguição à população de rua e defendem mais investimentos nas políticas públicas para população de rua.

“Eu vejo que pelo aumento de moradores de rua, a prefeitura não prioriza isso né, não prioriza os albergues, não prioriza resolver esse problema que é o do morador de rua.” Mari, integrante da Camisa 12

“Fechamento de albergue, tirar as pessoas de baixo de viaduto e simplesmente jogar as coisas fora e não dar uma perspectiva para essas pessoas.”Janaina,  vice-presidente da Força Feminina Colorada

 

“Quando se fecha albergue, se fecha restaurante popular é sempre ruim, porque tem pessoas que dependem desse lugar.– Leonardo “Bochecha”,  vice-presidente da Nação Independente Colorada

“Pra além de hoje (…) que exista uma política pública qualificada, que os aparatos que já existem pra isso recebam investimentos” – Integrante da Frente Inter Antifascista que preferiu não se identificar

Conheça a história de Deivid

Deivid, em situação de rua, denuncia o descaso da prefeitura em relação a população de rua. A pedidos dele, publicamos a conversa que fizemos na íntegra a entrevista. Assista abaixo:

“A política da prefeitura é podre. (…) Nós somos considerados um número, se dez saírem amanhã, dez entram, ou vinte, ou trinta, ou quarenta. Nesses albergues, eu vi constrangimento ilegal, eu vi agressões verbais, eu vi agressões físicas contra deficientes mentais, contra mulheres grávidas, contra idosos. Comigo nunca aconteceu nada, mas eu vi.” Deivid, em situação de rua

Conversa com Deivid, gremista em situação de rua

Deivid, em situação de rua, denuncia o descaso da prefeitura em relação a população de rua. A pedidos dele, publicamos a conversa que fizemos na íntegra a entrevista. Assista abaixo:“A política da prefeitura é podre. (…) Nós somos considerados um número, se dez saírem amanhã, dez entram, ou vinte, ou trinta, ou quarenta. Nesses albergues, eu vi constrangimento ilegal, eu vi agressões verbais, eu vi agressões físicas contra deficientes mentais, contra mulheres grávidas, contra idosos. Comigo nunca aconteceu nada, mas eu vi.” – Deivid, em situação de rua

Posted by Repórter Popular on Monday, July 8, 2019

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