Contra o coronavírus e os ataques ao povo: Solidariedade e luta!

 

Texto do Movimento de Organização de Base (MOB)

O sentimento de incerteza perante o futuro nos acompanha e não é de hoje. Há anos vimos nossos direitos sendo colocados em cheque, um por um. Vimos o direito à educação e saúde pública ficar prejudicado com a PEC do teto de gastos, que congela os gastos públicos nessas áreas; vimos a reforma da previdência, que dificulta nossa possibilidade de uma aposentadoria justa e digna; vimos o corte dos direitos trabalhistas, o aumento do desemprego e o aumento do trabalho informal, sem carteira assinada, as contas e gastos ficando cada vez maiores, o salário menor e mais incerto, o aumento da truculência policial, enfim, a nossa vida ficando pior. Esse cenário de precarização que temos vivido nos amedronta frente ao amanhã.

Os chamados trabalhadores informais são hoje grande parte da nossa população, em 2018 já ultrapassaram 40%, são camelos, motoristas de aplicativo, entregadores de comida, formam um grupo de trabalhadores que não possuem salários fixo, não tem direito a final de semana e nem horário de almoço remunerado e, infelizmente, é uma tendência que só cresce. Poucos de nós hoje em dia possuímos uma relação de trabalho com carteira assinada, CLT, férias remuneradas, FGTS, direito a afastamento remunerado em caso de problema de saúde, ou seja, poucos de nós hoje em dia conseguimos usufruir desses direitos que são frutos da história de luta da classe trabalhadora.

Vale ressaltar que mesmo para aqueles que trabalham de carteira assinada a conjuntura não vem sendo muito favorável. Perdemos muitos direitos que havíamos conquistado, a aposentadoria está cada vez mais longe, o salário não tem acompanhado o aumento dos custos de vida, a competitividade no mercado de trabalho nos pressiona a trabalhar mais por menos dinheiro, é sufoco atrás de sufoco, uma verdadeira tragédia que estamos vivendo nos últimos anos e já não é novidade para ninguém.

Se um trabalhador que é informal, sem contrato, microempreendedor, autônomo, ou seja lá como prefiram chamar, não trabalhar um dia por questões de saúde, é um dinheiro que vai faltar para fechar as contas no final do mês, certo? E se isso acometer a todos que exercem esse tipo de trabalho ao mesmo tempo? Serão famílias e famílias que não terão como garantir uma renda para passar o mês, se alimentar, pagar as contas que não deixarão de vir. É exatamente esse o cenário que estamos vendo emergir no Brasil agora.

A pandemia do corona vírus chegou ao Brasil e escancara as mazelas de uma sociedade que vem seguindo o caminho neoliberal, que sucateia os serviços públicos e corta direitos. Um governo que optou pela incerteza do amanhã como maneira de lucrar mais hoje – é todo lucro para já. Assim, quando se torna necessário adotar um estado de quarentena generalizada, vemos às claras o que esses tipos de políticas causam a nós, trabalhadores. O que os governantes incentivaram como “flexibilização” dos direitos trabalhistas é basicamente a isenção da responsabilidade do empregador para com o empregado, é a retirada daquilo que nos confere garantia de que se algo extraordinário acontecer, teremos como nos manter. Na lógica neoliberal, os lucros exorbitantes dos capitalistas valem mais do que as necessidades mais básicas dos trabalhadores. Algo extraordinário aconteceu e não temos garantia nenhuma de como será. As autoridades de saúde nos recomenda ficar em casa, mas isso é realmente uma possibilidade?

Sem trabalhar não teremos como pagar as contas que vierem, não teremos como nos alimentar e os alimentos, já caros, tendem a ficar mais caros nessas circunstâncias. Em contrapartida, se nos arriscarmos nas ruas, espalharemos ainda mais o vírus que é letal para a população mais velha ou debilitada. As crianças não vão para escola devido à quarentena, desse modo, o Estado vai se ausentar da alimentação dessas crianças e serão as famílias que terão que arcar com mais esses gastos, mais esses, dentre tantos outros que só fazem aumentar.

Isso tudo por que? Como chegamos nesse estado de coisas?

Não se pode prever quando virá um novo vírus, mas os problemas e medos que estamos vivendo agora vem de anos de políticas que proporcionam aos empresários sempre o máximo, mesmo que um dia pudesse resultar, como agora pode estar resultando, no risco às nossas vidas. Esse momento de pandemia evidencia e explicita que as nossas vidas nunca foram prioridade em um sistema que só nos enxerga como mão de obra facilmente descartáveis. Toda e qualquer política adotada pelo Estado a partir de agora será para remediar um dano que ele próprio vem causando, ou nem isso, tendo em vista que aprovaram uma medida provisória (MP 905) no dia 18 de março, terceiro dia da quarentena, restringindo ainda mais nossos direitos trabalhistas. Estamos diante de uma crise que tende a se alongar e absolutamente nada está sendo feito pelos de cima, que teoricamente nos representam, para lidar com a tragédia – que vai muito além do vírus – que estamos passando. Será sempre nós por nós.

Por isso, propomos as seguintes medidas como programa para a crise em que vivemos, em defesa da saúde e dos direitos dos trabalhadores nesse momento tão emergencial:

1 – Apoio mútuo e autoorganização do povo. Criação de fundos de arrecadação financeira e doações de produtos de higiene e alimentação. Façamos campanhas para arrecadar esses recursos e pressionar o poder público a tomar as devidas providências. Juntos somos mais fortes!

2 – Contra os ataques aos direitos dos trabalhadores! Contra demissões, cortes de salários e outras formas de responsabilizar os trabalhadores pela crise. Licença remunerada com abono de faltas e garantia de estabilidade para todos os trabalhadores (exceto da saúde e de serviços essenciais). Liberação imediata de trabalhadores que fazem parte do grupo de risco. Defenderemos nossa saúde: onde o trabalho não parar, que façamos greve!

3 – Assistência aos trabalhadores informais e desempregados! Paulo Guedes anunciou a assistência financeira de 200 reais para trabalhadores informais. Não podemos viver com apenas isso! Exigimos pelo menos um salário mínimo para trabalhadores informais e desempregados poderem sobreviver durante a quarentena.

4 – Solidariedade à população em situação de rua e sem-teto! Suspensão imediata de todos os despejos. Abertura de imóveis abandonados para servir de abrigo provisório para moradores de rua. Dormindo na rua estamos vulneráveis!

5 – Chega de cortes, o governo precisa investir no povo! Anulação da EC 95, de teto dos gastos e suspensão do pagamento da dívida pública para garantir recursos para investimentos públicos emergenciais, sobretudo nas áreas de saúde e saneamento básico.

6 – Nós não vamos pagar a conta da quarentena! Suspensão do pagamento de contas dos serviços básicos em todo país, inclusive os aluguéis. Proibição do corte de água, luz e gás durante a pandemia.

7 – Mais do que nunca: defesa do SUS! Retomada dos investimentos na saúde pública. Compra de medicamentos, materiais e equipamentos médicos para atendimento de qualidade. Contratações emergenciais de médicos, enfermeiros e técnicos. Abertura de hospitais privados para atendimento gratuito, com anexação temporária ao SUS.

8 – Atendimento urgente à população carente! Distribuição de kits de higiene, principalmente nas favelas e periferias. Congelamento dos preços de álcool gel, máscaras, etc. Testes gratuitos para o COVID-19 em massa, com atenção especial aos grupos de risco.

9 – Proteção aos trabalhadores em seus locais de trabalho e transporte. Garantia de proteção e materiais de higiene adequados aos trabalhadores da saúde, transporte e limpeza. Higienização dos transportes públicos (ônibus, trens, metrôs, etc.).

10 – Não à quarentena militarizada! A última coisa que a classe trabalhadora precisa agora é de mais repressão! Queremos assistência e serviços públicos de qualidade!