Comemoração de um ano da Retomada Mbyá-Guarani de Maquiné/RS

 Texto e imagens por Ramiro Valdez.

 

Nos dias 27 e 28 de janeiro, aconteceu,  a comemoração de um ano da Retomada Mbyá-Guarani de Maquiné, na aldeia Tekoá Ka’aguy Porã, que pode ser traduzido como “Aldeia da Mata Bonita”, no município de Maquiné/RS.   Estavam presentes em torno de cem pessoas, entre indígenas Guaranis de várias regiões do estado e apoiadores não indígenas de todas as partes, desde vizinhos e amigos da aldeia a pesquisadores, membros de instituições, movimentos sociais e ONGs.

 

 

  Num clima de alegria e reciprocidade, celebrou-se o marco de um ano desta retomada (ocorrida em 27 de janeiro de 2017) que, segundo o cacique André Benites, não é apenas a retomada de um território Guarani, tendo um significado mais amplo: “não é só essa área que nós estamos retomando, nós estamos retomando nossa vida”. Além disso, o cacique deixou claro que não se trata de uma invasão, ou uma ocupação, mas da recuperação de um território Mbyá-Guarani antigo. Por isso também o uso acertado do termo retomada, pois refere-se também à retomada dos direitos que lhes foram negados, da autonomia e da dignidade. Os indígenas reivindicam a demarcação e reconhecimento, por parte do Estado, de uma terra indígena Mbyá-Guarani no local o quanto antes.

 

 

  O evento começou no sábado de manhã, com cantos tradicionais Mbyá-Guarani, seguidos de falas das lideranças Guaranis presentes, assim como de alguns apoiadores não indígenas que foram convidados a dar seus relatos sobre como se deu seu encontro e com os Mbyá-Guarani da Retomada e com sua luta. As falas de todos eram permeadas de verdadeira emoção e apontavam para a necessidade de resistir no território e expandir a rede de apoiadores, deixando claro que aquela luta não é só pelos Guarani, ou pelos indígenas, mas também pelos não indígenas, e pela saúde do ambiente e do planeta.

 

  Cada pessoa que falou recordou algum episódio desta trajetória de um ano. Foram lembrados desde a decisão de retomar o território, os percalços para se estabelecer no local, a superação dos momentos difíceis – como a emissão de um pedido de reintegração de posse pelo Justiça Federal – e as vitórias – como a suspensão deste mesmo pedido pela Procuradoria Geral do Estado e o início de um processo de demarcação. 

  Após isso, fomos convidados a subir até a parte do território em que estão localizadas as primeiras casas da aldeia, e onde será construída a escola. Ali estava sendo preparado o almoço que, entre outros pratos, tinha mandioca, batata-doce e milho Guarani em abundância, todos plantados ali mesmo – foi enfatizado pelo cacique André que já estão sendo colhidas as sementes plantadas no território. E para acompanhar, servia-se suco de juçara da mata local com banana. Havia uma exposição de arte e artesanatos Guarani – cestos, animais esculpidos em madeira, maracás (chocalhos), etc.

 

 Depois do almoço, o cacique André Benites apresentou o projeto da Escola Mbyá-Guarani, que será construída em breve com apoio técnico, financeiro e material de apoiadores ligados à arquitetura e bioconstrução, e será feita várias mãos, através de mutirões organizados ao longo deste ano de 2018. O cacique contou que a construção de uma escola Guarani é um sonho antigo seu. “A ideia da escola”, segundo André, é “dar educação pros nossos filhos como a gente entende”, de forma autônoma em relação ao Estado, em que o modo de vida e os conhecimentos Mbyá-Guarani sejam verdadeiramente respeitados e passados às gerações mais novas de acordo com seus costumes e saberes. 

 

O cacique ainda ressaltou que a construção do espaço não dependerá do Estado, cabendo ao aparelho estatal apenas o reconhecimento legal desta escola, para que os jovens tenham um diploma validado, caso queiram cursar o ensino superior ou necessitem de um currículo para ingressar no mercado de trabalho. A escola será construída misturando práticas de bioconstrução e arquitetura tradicional Mbyá-Guarani. 

 

 Logo após as explicações sobre a importância desse espaço de ensino e aprendizado Mbyá-Guarani, o cacique André fez um convite para quem quisesse ver o resto da aldeia, conhecer as habitações da área principal da aldeia e a opý (casa de rezas e rituais), assim como caminhar ao longo das trilhas com os mais jovens, em meio à Mata Atlântica. Fez um convite também para quem quisesse permanecer onde estava, para aprender um pouco de artesanato com as mulheres Mbyá-Guarani, ou apenas conversar.

 

  

 Pelo final de tarde, após mais uma sessão de cantos e danças Mbyá-Guarani, ao som da rabeca, do violão, dos maracás, com o coral de crianças da aldeia, e após muitas brincadeiras e danças tradicionais em que os não indígenas tomaram parte, iniciou-se uma grande fogueira.

 

 

Muitas pessoas já montavam suas barracas. Outras tiveram de ir embora, como este vos fala, mesmo com o desejo de ficar para o domingo, em que haveria atividades pela manhã e mais um almoço delicioso, para fechar o evento com chave de ouro.

 

 

 Que venham os próximos aniversários na Tekoá Ka’aguy Porã, Retomada Mbyá-Guarani de Maquiné! Que germinem as sementes e nasçam cada vez mais crianças!

Aguyjevete!